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  • Foto do escritorHelder Lara Ferreira

Privatização e referendo no caso da Cemig em Minas Gerais

Atualizado: 2 de ago.


A Cemig, criada por JK, se transformou numa das maiores empresas de Minas e do Brasil, e tem uma extraordinária história de sucesso. Além disso, cumpre seu papel social, compensando regiões deficitárias com as superavitárias

O debate envolvendo o tema da “privatização” se acentuou no país a partir do início dos anos 1990. Muitas empresas públicas e de economia mista, nos diversos segmentos econômicos, foram privatizadas ou tiveram redução da participação acionária do Estado. Alguns casos bem-sucedidos e outros nem tanto, malsucedidos, até vistos por muitos como lesivos aos interesses da sociedade e do Estado brasileiro.


De fato, essas medidas não trouxeram os prometidos ganhos. No setor elétrico, os investimentos continuaram sendo feitos em maior monta pelas estatais. As empresas privadas investem mais significativamente somente quando recebem financiamentos subsidiados pelos bancos públicos ou quando se utilizam de programas governamentais de incentivo. Até hoje ainda existe muita polêmica, desinformação, ideologização e confusão de conceitos quando se debate esse tema.


A questão sobre a pertinência da privatização possui diversas nuances. Por exemplo, a literatura é pródiga em nos mostrar que, para monopólios naturais regulados, não há sustentação para a tese na qual as empresas privadas sejam mais eficientes que as públicas. As empresas públicas não têm acesso a facilidades muitas vezes concedidas ao setor privado, como a captação de recursos com prazos e juros mais favoráveis – usualmente subsidiados.


No setor elétrico, os indicadores de performance e de eficiência dessas empresas não ficam nada a dever às coirmãs privadas. Muitas empresas públicas desse setor são benchmarks, particularmente nos quesitos segurança, qualidade e continuidade do fornecimento de energia elétrica.


Vale dizer que as disparidades de objetivos das empresas públicas e privadas são grandes e muito raramente são consideradas pelos analistas para explicar o desempenho comparativo. Se considerar, além do indicador de rentabilidade, os de custo e de produtividade, o desempenho entre elas é similar.


Em ambiente competitivo, atuando no mesmo segmento e fiscalizadas por agências reguladoras, as diferenças de desempenho praticamente inexistem. As privatizações, portanto, não trazem certeza de melhoria de desempenho, ao contrário.


Outro ponto a se levantar: tem sido comum a subavaliação dos ativos (Usinas, Linhas e Subestações) das empresas de energia vendidas, o que pode representar prejuízo de bilhões de reais para os cofres públicos – e para a sociedade, em última análise.

Outro fator recorrente após a privatização de empresas no setor elétrico tem sido a reclamação da população ou dos usuários quanto à precarização da qualidade do serviço e aumento de preço.


O sucateamento, com a falta de investimentos nos ativos, na formação, treinamento, reciclagem e alta rotatividade das equipes leva a perda de conhecimento, comuns em empresas privatizadas, e são causas, dentre outras, da piora da prestação do serviço.


O mundo tem dado sinais que a onda de privatizações, açodadas ou por motivações meramente ideológicas, está em forte declínio. Aliás, muito do que foi privatizado em outros países está retornando ao controle estatal. Matérias na imprensa têm mostrado que, desde o ano 2000, quase 900 empresas foram reestatizadas, mesmo em países expoentes do capitalismo, justamente pelo fato de essas empresas privatizadas priorizarem apenas o lucro, em detrimento da qualidade dos serviços.


A Cemig foi criada pelo então Governador Juscelino Kubitschek, se transformou numa das maiores empresas de Minas e do Brasil, e tem uma extraordinária história de sucesso. Passou por momentos difíceis, tendo superado todos. No Estado de Minas Gerais, a Cemig atende 96% do mercado de energia elétrica, tem regiões superavitárias e outras deficitárias que de certa maneira são compensadas pelas que dão lucro, com a empresa cumprindo seu papel social.


A exemplo do Brasil, Minas Gerais é desigual em termos socioeconômicos e a Cemig atende o maior percentual de consumidores de baixa renda do país. As famílias são beneficiadas com descontos de até 65% na fatura de energia.


Ainda que sirva à população de baixa renda, a Cemig é uma empresa pública lucrativa e eficiente. Atende aos irrigantes do agronegócio, implantou um dos maiores programas de eletrificação rural do País, é formadora de mão de obra qualificada, reconhecida nacional e internacionalmente, fomenta o desenvolvimento da indústria e do comércio no estado.


A sociedade mineira é ciosa da importância da Cemig. Por tudo isso, a empresa não pode, de forma atropelada, e sem fundamentação, ser desqualificada e desvalorizada, como vem acontecendo nos últimos anos. Toda empresa pública deve ser respeitada, defendida e bem gerida pelo acionista majoritário, o Governo do Estado, o qual, inclusive, recebe importantes dividendos anualmente que certamente contribuem para outros tantos serviços para a sociedade mineira.


Ademais, ressalta-se que, em 2001, a partir da liderança do Governador Itamar Franco, a Assembleia Legislativa de MG, de forma soberana e zelosa dos seus deveres, aprovou emenda à Constituição Mineira, exigindo 3/5 da casa e referendo popular para que fossem aprovadas propostas de alienar os patrimônios públicos dos mineiros, dentre eles a Cemig e a Copasa.


O então governador e os nobres deputados anteviram que iniciativas de privatização poderiam surgir e tentaram proteger esses ativos de medidas açodadas e sem um debate amplo e qualificado que o tema exige.


Finalmente, é relevante deixar claro que essa tentativa de retirar da Constituição Mineira a obrigatoriedade de ouvir a população sobre esse caso, além de se querer mudar a regra com o jogo em andamento, é um enorme desrespeito ao direito soberano dos mineiros de decidirem, democraticamente, sobre alguns de seus maiores patrimônios.


Sendo assim, cabe aos deputados e ao povo analisar, de forma criteriosa, se fazem sentido os argumentos favoráveis e contrários à privatização. Depois de um debate público correto e transparente, seria tomada a decisão de acordo com a regra vigente. Mais proveitoso seria promover ações para resgatar a melhor governança da empresa, tornando-a ainda mais forte e eficiente, o que poderá, inclusive, auxiliar no processo de equalização das contas públicas mineiras, há tanto tempo em grandes dificuldades.


Helder Lara Ferreira é engenheiro eletricista e mestre em Engenharia Elétrica. Foi gerente de departamento na Cemig e atualmente é sócio-diretor da RLX Engenharia e Consultoria Ltda.


Crédito da foto da página inicial: Cemig/Divulgação

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