Nos últimos tempos tem-se assistido a um grande aumento de expressões feministas, seja na esfera política, nas mídias sociais, ou mesmo no debate público. Com o crescimento expressivo dessas manifestações, há aquelas e aqueles que festejam, e há aquelas e aqueles que lamentam.
Contudo, não se pode contestar que o feminismo tem tido uma centralidade marcante no Brasil e no mundo. E, ao que tudo indica, para tristeza ou felicidade, essa centralidade parece ser irreversível. A partir desse cenário, e na ocasião da comemoração do Dia Internacional da Mulher, argumento aqui que o melhor presente que poderíamos querer, e incluo não só as mulheres, mas também a sociedade como um todo, é que haja mais igualdade de gênero.
Explico por quê. Antes, porém, é necessário que se estabeleça uma conceituação de feminismo e que se explicite a ligação entre feminismo e igualdade de gênero.
Dentre as várias concepções e escolas de pensamento feministas, para esse breve artigo adoto a perspectiva segundo a qual o feminismo preconiza que devem haver oportunidades iguais para homens e mulheres. Dessa forma, adimensão do feminismo dessa autora é contra qualquer tipo de discriminação ou de desigualdades nas oportunidades.
Assim, sendo a concepção de feminismo aqui adotada aquela que diz que todas e todos devem ter oportunidades iguais, algumas e/ou alguns se perguntam: por que então o foco sobre as mulheres? Por que a igualdade de gênero necessariamente perpassa pelo feminismo, se a ideia é que haja justamente a igualdade?
A resposta para essas duas questões é bastante simples: feminismo e igualdade de gênero são sinônimos (ao menos na atualidade) devido às tensões e discriminações que ainda recaem fortemente sobre as mulheres. Diante desse fato, argumentar em favor da igualdade de gênero necessariamente perpassa por uma discussão séria sobre como melhorar a posição das mulheres na sociedade.
No Brasil, por exemplo, apesar de mais escolarizadas em média que os homens e cada vez mais presentes e atuantes no mercado de trabalho, as mulheres ainda enfrentam a persistência da discriminação e desigualdade em vários segmentos (salários, oportunidades de carreira, participação política).
Ainda, como se não bastasse, as mulheres enfrentam tensões intrafamiliares referentes à desigual divisão das tarefas domésticas e do cuidado com filhos e idosos: dados recentes da OECD (2014) revelam que, no mundo, as mulheres gastam 4,5 horas por dia nessas tarefas não remuneradas, enquanto os homens gastam menos da metade desse tempo. Ou seja: as mulheres gastam (e continuarão gastando) mais horas do que os homens realizando tarefas domésticas simplesmente pelo fato de que a sociedade assume que isso é sua responsabilidade.
Tendo em vista essas contradições, as mulheres têm cada vez mais se organizado e buscado que suas vozes e anseios sejam ouvidos em todas as dimensões da vida pública e privada. De forma surpreendente, ocorre que seus anseios têm sido fortemente ecoados por grandes instituições de formulação e implementação de políticas públicas, como o Banco Mundial, as Nações Unidas, e mesmo por organizações não governamentais, como a Fundação Bill & Melinda Gates.
E isso não é à toa. Por detrás desse apoio está a constatação de que a igualdade de gênero possui um papel central para o desenvolvimento econômico. Isso porque a igualdade de gênero permite: i. que se alivie o peso da pobreza, que atinge mais as mulheres; ii. que a fecundidade seja reduzida, aumentando-se as oportunidades de investimento na qualidade da saúde e educação das filhas e filhos; iii. que haja uma expansão das aspirações e oportunidades disponíveis às mulheres, como, por exemplo, a participação política e diversificação de possibilidades de carreira. Em outras palavras, mais igualdade de gênero se traduz, além de mais bem-estar para mulheres e homens, em mais prosperidade econômica.
Infelizmente, apesar do consenso de que é preciso que se eliminem os diferenciais de gênero, ainda permanecem normas e barreiras que são de difícil enfrentamento, que incluem estereótipos e diversas formas de silenciamento, marginalização, ou mesmo violência contra as mulheres.
Um exemplo notório disso foi o projeto de lei 5.069/2013, proposto pelo Deputado Eduardo Cunha, que prevê um grave retrocesso para os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres ao impor restrições para a prática do aborto no Brasil, e que gerou protestos em todo o país.
Tendo em vista essas barreiras, deve-se admitir de forma inequívoca que a eliminação da desigualdade de gênero exige intervenções de política explícitas. Dessa maneira, intervenções como cotas, concessão de direitos e proteção às mulheres, transferência de recursos financeiros para as mães em programas sociais, e assim por diante, são imprescindíveis.
Felizmente, o Brasil e o mundo têm experimentado avanços em relação à igualdade de gênero. No caso brasileiro, houve significativos avanços em políticas públicas para redução da discriminação de gênero e melhoria do empoderamento feminino.
Contudo, muito há ainda o que se fazer. É necessário que haja a garantia dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, que reduzem de forma significativa as taxas de mortalidade materna. É preciso que se formulem e implementem políticas públicas voltadas para a proteção econômica das mulheres em meio à crise econômica mundial.
Por fim, mas não se encerrando a lista de afazeres, é preciso que haja uma maior inclusão das mulheres na política, que hoje representam somente 10% do parlamento nacional e 13% dos quadros legislativos municipais (Revista do Observatório Brasil da Igualdade De Gênero, Ano V – Número 7, Dezembro/2015).
A tarefa é desafiadora, mas encará-la é, sem dúvidas, o melhor presente para as mulheres e para a sociedade como um todo.
Crédito da foto da página inicial: Fernando Frazão/ABr
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