O contexto da desregulamentação das relações de trabalho na década de 1990 favoreceu a proliferação de contratações chamadas atípicas, ou seja, com a diversificação da forma do uso e remuneração da força de trabalho. A forma de contratação por tempo indeterminado, característica das relações regulamentadas pela CLT, pode ser legalmente substituída por formas diversificadas de regime de trabalho como ocorre, por exemplo, com as terceirizações – quando uma parte de trabalho é separada e fatiada e sai da estrutura da empresa, ou mesmo na transformação direta do empregado em empresa, por meio dos contratos Pessoa Jurídica (PJ), que transformam uma relação de trabalho subordinado em um contrato entre empresas – a pejotização (Pochmann, 2008).
A partir de 2005 a tributação referente às Pessoas Jurídicas sem empregados passou a ser prevista no artigo 129 da lei 11.196/2005. A legislação dispõe que a tributação fiscal e previdenciária para prestadores de serviços intelectuais, artísticos e culturais seria a mesma aplicada a Pessoas Jurídicas, abrindo espaço para legalização da pejotização individual.
A pejotização tem ocorrido principalmente nos setores de trabalho intelectual, com maior incidência entre os jornalistas e profissionais da área de comunicação (Krein, 2013; Silva, 2014). Os trabalhadores submetidos a contratos como PJ ficam obrigados a cumprir toda a legislação tributária referente a uma empresa individual e, por outro lado, são privados dos direitos e garantias da CLT. Assim, mesmo com previsão em lei, esta forma de contratação tem sido controversa, pois o respaldo legislativo levou à proliferação de contratos que podem ser caracterizados como fraude, com a subtração dos direitos trabalhistas e previdenciários (Krein, 2007).
Com a reforma trabalhista em vigor desde novembro de 2017 (Lei 13467/2017), o quadro tende a piorar: precarização da jornada de trabalho com a regulamentação do teletrabalho (home office), o trabalho intermitente, entre outras formas de precarização dentro de um “cardápio” de desregulamentações (Teixeira et. al, 2017) devem afetar ainda mais o setor da imprensa e comunicação.
Dados apresentados pela Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) mostram que a categoria vem constituindo-se, nos últimos anos, numa das mais atingidas pela onda de precarização das relações de trabalho, com atrasos e não pagamento de direitos trabalhistas, baixos salários, arrocho, assédio, violência e a generalização do trabalho sem qualquer vínculo empregatício, os chamados de frilas e frilas-fixo, além da imposição da pejotização a parte da categoria (1).
Outro ponto a ser observado é que o avanço da tecnologia da informação nas últimas décadas provocou profundas mudanças na forma de produzir e difundir notícias. Houve a mudança na base tecnológica, queda de tiragem dos impressos e crise do modelo de negócios.
Fígaro (2012) detecta que o cenário concentração e oligopolização do setor de comunicação, somado à informatização e novas tecnologias de captação e transmissão das informações, têm levado à redução do número de profissionais nas redações.
Assim, parte da categoria atua nas chamadas mídias independentes. Conforme relato da jornalista Laura Capriglione, da plataforma Jornalistas Livres, em 2017 existiam mais de 2 mil veículos de mídia independente, que utilizam redes sociais, rádios comunitárias e outras novas formas mídias. O desafio desta forma de atuação é como financiar e sobreviver neste negócio (2).
Por outro lado, as empresas de mídia retiram lucros principalmente na base do rentismo e outros negócios não necessariamente ligados ao jornalismo (3), sem abrir mão da oligopolização do setor. No contexto do capitalismo globalizado das grandes corporações financeiras, os meios de comunicação de massa podem ser localizados como parte de uma engrenagem de geração de lucros, produção e circulação de informações e de construção de consensos dentro dos interesses do mundo das finanças global (JOSÉ, 2010).
Por serem empresas vinculadas ao capital financeiro, formam o principal mecanismo de construção da narrativa que justifica as reformas regressivas de direitos da classe trabalhadora de desmonte das políticas sociais. Conforma-se uma atuação ideologicamente blocada e um monopólio de discurso.
*Artigo produzido com base em pesquisa de mestrado em Economia Social e do Trabalho no Instituto de Economia da Unicamp, em andamento.
Notas
(1) Disponível em fenaj.org.br/firmes-na-luta-em-defesa-da-democracia-dos-direitos-dos-trabalhadores-e-contra-o-golpe/ acesso em 30/04/218
(2) Análise feita durante palestra de abertura do 15º Encontro Estadual dos Jornalistas realizado na cidade de São Paulo, entre os dias 4 e 6 de agosto de 2017.
Referências
FÍGARO, Roseli. O perfil do jornalista e o discurso sobre jornalismo. Um estudo das mudanças no mundo do trabalho do jornalista profissional em São Paulo. ECA/USP: 2012.
GALVÃO, Andreia; TEIXEIRA, Marilane; KREIN, José Dari; BIAVASCHI, Magda; ALMEIDA, Paula Freitas; ANDRADE, Hélio. Contribuição crítica à reforma trabalhista: Campinas, Unicamp /CESIT: 2017.
JOSÉ, Emiliano. Jornalismo de campanha e a Constituição de 1988. Salvador: EDUFBA; Assembleia Legislativa da Bahia, 2010.
KREIN, José Dari. Tendências recentes das relações de emprego no Brasil – 1990-2005. Tese (doutorado). Unicamp, Instituto de Economia: 2007.
POCHMANN, M. A superterceirização do trabalho. FAGANANI. E, (org.). Debates contemporâneos – economia social e do trabalho 2. São Paulo, LTr: 2008
SILVA, Cladio Marcos. A precarização da atividade jornalística e o avanço da pejotização. Dissertação (Mestrado em Comunicação). Faculdade de Comunicação, Universidade de Brasília. Brasília: 2014.
Crédito da foto da página inicial: EBC
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