Há tempos o desempenho da indústria de transformação brasileira tem se configurado como uma fonte permanente de preocupação entre economistas alinhados, grosso modo, às correntes desenvolvimentistas.
Para estes, tal preocupação transcende a contribuição imediata da indústria para o baixo dinamismo do PIB no período recente, conforme constatado a partir de dados divulgados pelo IBGE com relação ao ano de 2014. Transcende porque, segundo as interpretações heterodoxas – estruturalistas, Kaldorianas, Schumpterianas, entre outras –, as transformações na estrutura produtiva se configuram como um dos elementos centrais para se compreender as trajetórias de longo prazo das economias capitalistas.
Neste cenário, ao se analisar a qualidade do crescimento industrial brasileiro para além da conjuntura de curtíssimo prazo, as preocupações se potencializam. Isso porque, mesmo em períodos que o desempenho mostrou-se bastante superior ao de 2014, observou-se uma gradativa perda de qualidade do dinamismo industrial brasileiro.
Essa perda de qualidade, admitida por este artigo, está assentada em pelo menos duas dimensões: (i) a concentração crescente do crescimento em um número reduzido de setores e a (ii) a tendência de redução da intensidade de capital por pessoal ocupado.
No que diz respeito à primeira dimensão, observa-se que além de a indústria ter reduzido sua contribuição para o crescimento do PIB de um patamar de cerca de 35% entre as décadas de 1970 e 1980 para cerca da metade deste valor nos anos 2000 e para uma contribuição negativa no período recente, o crescimento industrial cada vez mais tem se concentrado nos grupos de setores intensivos em escala e em recursos naturais.
Conforme pode ser observado no gráfico a seguir, estes setores foram responsáveis por cerca mais de 2/3 do crescimento do valor da transformação industrial (VTI) brasileira no período entre 1996 e 2010.
Adicionalmente a esta grande concentração do dinamismo em dois grupos de setores, tem-se observado que mesmo em períodos de crescimento do VTI, os ativos industriais não crescem na mesma proporção.
Assim, segundo dados da PIA/ IBGE, quando se observa a relação entre os ativos e o número de pessoas ocupadas entre 2000 e 2010 percebe-se um movimento quase generalizado de queda deste indicador (exceto nos setores intensivos em recursos naturais, com grande destaque para a indústria petroleira).
Como resultado indireto deste fenômeno, observa-se uma piora na qualidade do crescimento industrial, uma vez que a queda da intensidade de ativo por pessoal ocupado está associada (no caso brasileiro) ao desadensamento das cadeias produtivas locais e à limitação do crescimento da produtividade (admitindo-se a relação entre esta e a intensidade de capital por pessoal ocupado).
Frente a estas armadilhas colocadas à retomada do papel da indústria como elemento central para o crescimento econômico brasileiro, mais do que compreender os impactos da conjuntura política e econômica atual no desempenho industrial, surge um desafio estrutural às políticas econômica e industrial – ainda que esta última esteja rotulada negativamente em Dilma II: a necessidade de fazer com que em um hipotético cenário de retomada do crescimento industrial, este não mais prescinda – como o fez ainda que parcialmente no último ciclo de expansão – do investimento e do aumento da intensidade de capital por trabalhador, sem os quais se limitam substancialmente o potencial de crescimento da produtividade do setor e as transformações virtuosas na estrutura produtiva.
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