Muito antes de se tornar o iconoclasta ministro das finanças grego, Yanis Varoufakis escreveu um instigante artigo em que declara enxergar o mundo a partir da perspectiva marxista e, simultaneamente, se considera um marxista errático. Nesse texto, Varoufakis traz pelo menos três que pontos capazes de provocar reflexão, polêmica e crítica.
O primeiro refere-se à natureza do debate econômico e dos dilemas dos economistas marxistas. De forma contraditória, Varoufakis aponta razões marxistas para ignorar Marx em sua produção acadêmica.
Ou seja, sua opção foi a de aceitar os axiomas neoclássicos para expor suas inconsistências em detrimento da construção de teorias alternativas que, segundo ele, dificilmente seriam levadas a sério: “mesmo minha economia não marxista foi guiada por uma mentalidade influenciada por Marx”.
O segundo ponto refere-se às suas interpretações da teoria marxista, em que Varoufakis é certeiro em apontar que Marx nos dá instrumentos para desmontar a ideia neoliberal de que “a riqueza é produzida privadamente e então apropriada por um Estado quase ilegítimo, através dos impostos”, e substituir pelo seu oposto “a riqueza é produzida coletivamente e então apropriada de maneira privada através das relações de produção e direitos de propriedade”.
No plano teórico, Varoufakis também discute a natureza dual e contraditória do trabalho humano, que considera a grande inovação teórica de Marx. Alguns marxistas diriam, porém, que sua ênfase na dualidade do trabalho e na relação capital-trabalho, deixa de lado elementos importantes da teoria de Marx, em particular, a autonomização do dinheiro como desdobramento da relação capital-trabalho e como elo de dominação dessa relação.
Por fim, o terceiro ponto para reflexão é a crítica aos “dois erros espetaculares” de Marx. Segundo Varoufakis, Marx falhou ao não refletir suficientemente sobre os impactos políticos de sua teorização e assim permitiu que discípulos usassem o poder de suas ideias para sua própria base de poder. Além disso, cometeu um erro mais grave, pressupôs que a verdade sobre o capitalismo poderia ser descoberta na matemática dos seus modelos:
“Este foi o maior desserviço que ele poderia ter prestado para seu próprio sistema teórico. O homem que nos equipou com a liberdade humana como um conceito econômico de primeira ordem; o acadêmico que elevou a indeterminação radical a seu lugar correto na economia política; foi ele a mesma pessoa que acabou por brincar com modelos algébricos simplistas, nos quais as unidades de trabalho eram naturalmente e completamente quantificadas, esperando contra toda a expectativa evidenciar a partir destas equações alguns lampejos adicionais sobre o capitalismo. Após sua morte, economistas marxistas desperdiçaram longas carreiras em prol de um tipo similar de mecanismo escolástico. Completamente imersos em debates irrelevantes sobre “o problema da transformação” e o que fazer sobre isto, eles quase se tornaram uma espécie extinta à medida que o rolo compressor neoliberal esmagava toda dissidência em seu caminho.”
Veja o artigo completo, com tradução de Gustavo Noronha para o Brasil Debate AQUI ou o artigo em inglês publicado no site de Varoufakis e boa leitura!
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