O debate no campo econômico se voltou nos últimos dias para o tema da crise internacional e seu impacto sobre o Brasil.
O ambiente de estagnação e elevada incerteza que se formou nas principais economias do globo (EUA e zona do euro), ao gerar um declínio dos fluxos de comércio e alta volatilidade dos fluxos financeiros, impactam, ainda que de forma desigual, as economias emergentes.
Certos economistas, no entanto, afirmam que a crise internacional já arrefeceu (como declarou Armínio Fraga em entrevista conjunta com Guido Mantega no canal Globonews) e que o desempenho econômico brasileiro recente se deve, sobretudo, à falta de confiança ensejada pelas políticas econômicas adotadas.
Os exemplos que supostamente ilustrariam esse argumento se concentram no crescimento relativamente vigoroso de alguns países da América Latina: tais como Colômbia, Peru e México.
Mas será possível explicar o dinamismo econômico desses países simplesmente pela estabilidade das “regras do jogo”, ou se trata de mais um conto, dentre os inúmeros já existentes, da fada da confiança que povoa a mente de muitos economistas?
De fato, o crescimento recente (e também aquele previsto para 2014) da Colômbia, do Peru e do México não é o desdobramento “natural” de um ambiente que transmite mais confiança ao empresariado em virtude do menor peso do Estado na esfera econômica.
Conforme aponta o Estudio Económico de América Latina y el Caribe da Cepal (órgão da ONU), esses três países praticaram políticas claramente de cunho expansionista – inclusive como forma de contrarrestar os efeitos da crise internacional, que segundo aqueles economistas já não mais sequer existia.
No caso da Colômbia, o governo incrementou fortemente seus gastos em investimentos (aumento de 19% em 2013 em relação a 2012) por meio do Plano de Impulso à Produtividade e ao Emprego.
Os detalhes do plano evidenciam semelhanças com algumas medidas adotadas pelo Brasil recentemente, tais como a redução dos custos de energia, desoneração da folha de trabalho e o uso de crédito subsidiado por meio de ampliação dos bancos públicos de desenvolvimento.
O Peru, por sua vez, apresentou uma política fiscal e monetária expansionista, permitindo um aumento do investimento público e do consumo privado.
Já quanto ao México, a redução do crescimento em 2013 (1,0%) em comparação a 2012 (4,0%) foi, em grande parte, resultado de um ajuste fiscal que desacelerou a demanda interna, levando a uma reorientação das autoridades domésticas.
O crescimento de 2,5% esperado em 2014 expressa o déficit público de 3,5%, já aprovado pelo Congresso, o qual inclui investimentos da Pemex (empresa estatal do setor de petróleo).
Portanto, as ações dos nossos vizinhos, diante do cenário de turbulência da conjuntura internacional, direcionaram-se para a sustentação e/ou até mesmo ampliação do papel do Estado no estímulo à demanda agregada.
Nesse sentido, o crescimento não veio acompanhado de um suposto aumento da confiança decorrente de uma diminuição do intervencionismo estatal. E, portanto, da discricionariedade. Tampouco foi resultado do estabelecimento de instituições e normas transparentes – que embora necessárias, não são suficientes para promover o crescimento.
Destarte, o debate acerca do futuro da economia brasileira não pode se concentrar na oposição austeridade versus discricionariedade (ou neutralidade versus intervencionismo).
Como demonstra a experiência recente desses três países, as discussões devem ser feitas no contexto de um Estado atuante. De fato, se a confiança é um fator relevante para o dinamismo econômico, ela não é um fruto da neutralidade do Estado (como muitos parecem sugerir) e, sim, do direcionamento de suas ações frente a momentos adversos.
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