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NÃO HÁ VAGAS (O Brasil e a globalização produtiva)

Os economistas tucanos têm usado recorrentemente argumento de que o Brasil fez uma escolha errada, ao não optar pela inserção nas cadeias globais de valor como estratégia primordial de desenvolvimento econômico.

A afirmação aparece no programa do candidato Aécio Neves, no qual se lê a pagina 31: “É imperativo que nosso país deixe de ser um dos mais fechados do mundo e que seja definida uma estratégia de integração competitiva das empresas brasileiras às cadeias mundiais de valor”.

As razões alegadas para este equívoco seriam: o baixo grau de abertura da economia brasileira, decorrente da ausência de acordos de livre comércio, principalmente com os EUA e a União Europeia, a não realização das reformas microeconômicas, dentre as quais a trabalhista e a tributária, e, nos últimos 12 anos, um “excessivo” aumento dos salários.

Afora alguns aspectos particulares corretos, relativos à estrutura tributária, é possível demonstrar a inconsistência genérica da tese à luz de fatos históricos.

Comecemos por indagar quais países, e como, se inseriram nas cadeias globais de valor. Em primeiro lugar, os desenvolvidos, que as criaram por meio da terceirização (outsourcing) dos segmentos mais intensivos em trabalho da cadeia produtiva.

Em segundo lugar, articularam-se a essas cadeias os países subdesenvolvidos com mão de obra muito barata, como China e asiáticos de menor desenvolvimento.

Dois destaques devem ser anotados: primeiro, ao longo do tempo a China foi capaz de internalizar etapas mais complexas e intensivas em tecnologia da indústria, combinando atração de IDE e desenvolvimento empresarial doméstico, por meio de uma articulação de políticas econômicas, cuja essência era a desvalorização da sua moeda, e uma miríade de incentivos tarifários, tributários e creditícios que conformaram uma política industrial de alta complexidade e sofisticação.

Outro grupo de países exitosos como Taiwan, Coreia e Singapura, utilizaram as exportações, mas não as maquilas como mecanismo privilegiado de inserção.

Desde os anos 1960 contaram com farto apoio norte-americano e uma elevada tolerância para com suas políticas intervencionistas, de formação de grupos empresariais locais, transferência induzida de tecnologia, abertura unilateral de mercados etc.

Ou seja, a lógica que moveu este último modelo foi geopolítica e não econômica, não havendo, portanto, um modelo único de inserção, mesmo entre os asiáticos.

Cabe considerar também a tentativa de um grupo países latino-americanos e, em especial do México, em integrar sua indústria nas cadeias globais de valor.

A opção deste país esteve assentada no pretenso acesso privilegiado ao mercado e a capitais norte-americanos resultante da adesão ao NAFTA em 1994.

Todavia, o custo da mão de obra sensivelmente mais barato na China condicionou as escolhas de outsourcing da grande empresa americana beneficiando muito mais este país, tendência que se exacerbou nos anos 2000.

Dados do economista francês Patrick Artus ilustram a relevância do diferencial de salários para explicar a globalização produtiva: em 2007, cerca de um quarto de século após iniciado o processo de fragmentação das cadeias, o salário médio por hora, com encargos, na indústria de transformação, era de US$ 25 nos EUA, US$ 5 no Brasil, US$ 3 no México e US$ 1,5 na China.

Como resultado desse padrão de inserção internacional, o desempenho do México foi frustrante.

De acordo com dados da CEPAL, nos últimos 20 anos, sua taxa média de crescimento anual foi de 2,7%, muito inferior à do Brasil de 3,8%. Esta diferença se acentuou entre 2003-2008, pois o México cresceu em média 3,1% a.a, enquanto que o Brasil cresceu 4,2% a.a.

Após a crise financeira internacional, entre 2009-2013 a taxa anual média de crescimento do México declinou para 1,9% a.a., enquanto a do Brasil para 2,7% a.a.

Não só no crescimento econômico, mas também no aumento da produtividade, o desempenho do Brasil foi superior ao do México, com aumento anual de 3% a.a. entre 2001 e 2010 contra 2% a.a. deste último.

Contudo, é na situação social que os contrastes são mais marcantes. O Brasil apresenta indicadores bem mais favoráveis no que tange à evolução dos salários, melhoria do Gini e redução da pobreza.

Na questão do desemprego a diferença é mais gritante. A despeito de taxas formais de desemprego em patamares semelhantes, de cerca de 5% da força de trabalho, é crucial considerar, segundo dados do Migration Policy Institute, que até 2013 o México havia exportado para os EUA aproximadamente 12 milhões de pessoas, das quais, 87%, ou 10,5 milhões, em idade de trabalhar, ou seja, 20% da sua força de trabalho. Não fora isto, a situação social neste país seria catastrófica.

A lição que o México ensina ao Brasil é que países de renda média com o patamar salarial substancialmente mais elevado do que os asiáticos enfrentaram percalços para participar das cadeias globais de valor.

Ademais, uma coisa é internalizar a indústria por meio de maquilas onde esta indústria não existia, outra é convertê-la em maquiladora com drásticas implicações sobre o emprego. A estratégia brasileira de inserção internacional não poderia se basear na competição fundada em baixos salários e na abertura comercial rápida e indiscriminada.

O que fez o Brasil recentemente? Manteve e ampliou a sua inserção externa via agronegócio e minérios, tendo sido beneficiado pelo amplo e disseminado do ciclo de preços das commodities, embora a elevada produtividade desses segmentos no Brasil seja incontestável.

Por sua vez, ampliou a exportação de manufaturados para a América Latina. Ademais, a indústria brasileira, ao contrário das afirmações, realizou abertura significativa nos últimos dez anos, como mostra pesquisa do IEDI.

Em 2011, a indústria de transformação registrava um coeficiente de importação de insumos de cerca de 20%. Essa média esconde alguns setores com abertura significativa dentre os quais: Química 44%, Informática 77%, e Metalurgia 47%, dentre outros.

Por último e, principalmente, expandiu o mercado interno de consumo de massas por meio do aumento do emprego, da melhora da distribuição de renda e do acesso ao crédito.

Esse conjunto de fatores promoveu um crescimento que, entre 2003 e 2010, foi liderado pelo investimento e não pelo consumo como afirmam os críticos.

A partir de 2010, por efeito da crise e de obstáculos internos, o modelo perdeu parte do dinamismo. Além da deterioração das relações de troca, o acirramento da competição nos manufaturados por conta do excesso de capacidade na indústria internacional produziram danos na demanda externa. Internamente, os gargalos da infraestrutura revelaram-se cruciais.

Diante desse quadro, quais os desafios a enfrentar? Desde logo, preservar a estratégia de ampliação do mercado interno complementada pelo aumento das exportações.

Estas últimas, como, aliás, o conjunto da produção, devem se fundar em escalas produtivas e produtividade elevada e não em baixos salários. Baixo este pressuposto deve-se buscar uma maior participação nas cadeias de produção globais.

Tomando como referência a proposta de Bielschowsky discutida AQUI, a estratégia de crescimento deveria ancorar-se também em: expansão da exportação de commodities baseadas em recursos naturais, com diferenciação da cadeia produtiva, sem especialização em baixo valor agregado; ampliação da infraestrutura por meio de concessões e do investimento público; dinamismo do consumo fundado na melhor distribuição de renda e crédito.

A isto agregaríamos o aprofundamento da integração sul-americana com o objetivo de consolidar um mercado de massas regional.

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