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Inflação, aumento real de salário e risco de aceleração

A recente elevação moderada na taxa de inflação brasileira está associada ao aumento do preço das commodities dentro do Brasil e à inflação salarial.

O crescimento do salário nominal está orientando uma mudança de preços relativos que ocorre simultaneamente ao aumento do salário real e à melhora na distribuição dentro do mercado de trabalho. Mais do que isso, é justamente a inflação salarial que tem promovido o crescimento do salário real e a mudança na distribuição (leia mais em Uma relação entre inflação e distribuição de renda).

A discussão sobre a aceleração inflacionária costuma levar a referências sobre o processo inflacionário dos anos 1980. Aqui é importante desfazer uma confusão. Aquele era um processo de alta inflação resultante de uma profunda crise de balanço de pagamentos que atingiu não só o Brasil como todos os países em desenvolvimento.

Diferentemente do que acontecia na década de 1980, a redistribuição dentro do mercado de trabalho não está inserida em um contexto de queda do salário real médio, como podemos ver no gráfico abaixo.

Durante os anos 1980, a prática da correção monetária protegia o rendimento do capital (a taxa de lucro) e qualquer choque de custos que acontecia na economia brasileira gerava aceleração inflacionária e queda do salário real médio.

Nos últimos anos, a partir de uma base elevada, houve uma redução da taxa de juros real e da taxa de lucro na maioria das atividades produtivas. A redução das elevadas margens de lucro nada mais é do que o contraponto distributivo do crescimento do salário real médio.

Para amenizar as disputas distributivas é importante aumentar o crescimento da produtividade do trabalho. O crescimento mais acelerado da produtividade permitiria alcançar taxas mais altas de crescimento do salário real sem acirrar o conflito distributivo ou pressionar as margens de lucro.


grafico salario medio real

Ainda que a elevação moderada da taxa de inflação no Brasil esteja diretamente associada a um aspecto positivo em termos distributivos, sua exacerbação pode levar a processos de indexação de preços que, ao fim, o tornarão disfuncional, expondo a economia ao risco da aceleração inflacionária caso ocorra um choque exógeno de custos.

Nos modelos de conflito distributivo, a elevação da inflação para patamares mais altos, como, por exemplo, de dois dígitos, ativa novos mecanismos de indexação.

Para usarmos uma referência da década de 1980, podemos pensar em um exemplo dramático, porém didático. Quando a inflação alcançou níveis muito elevados, os preços e salários passaram a ser renegociados semestralmente, e não mais anualmente.

O efeito disso foi elevar ainda mais a indexação da economia brasileira, acirrar o conflito distributivo e reduzir os graus de liberdade para a condução da política econômica.

Isto está muito longe de ser o caso atual, mas coloca sempre na pauta da política econômica a necessidade de atenção a fatores de oferta que possam fazer contraponto a elevação exógena de custos.

É por isso que o governo brasileiro tem usado mais intensamente algumas desonerações fiscais localizadas e, por exemplo, segurado o preço do diesel e da gasolina, dois insumos chaves.

Foi também nos momentos em que a inflação se aproximava de 7% que o governo buscou reverter, temporariamente, a desvalorização cambial. No começo de 2011, já no Governo Dilma, com o preço das commodities subindo rápido, o câmbio nominal foi valorizado.

É claro que alguns desses mecanismos também apresentam limites. A contenção dos preços da gasolina e do diesel, por exemplo, não deve comprometer a capacidade de investimento da Petrobras e sua estratégia de longo prazo.

Assim, é mais interessante evitar novas elevações na taxa de inflação brasileira. Por exemplo, evitar uma desvalorização cambial excessivamente rápida, que pudesse, eventualmente, levar à inflação a casa dos dois dígitos.

O quadro atual permite inflação estável e melhora na distribuição de renda. De acordo com o cenário, é possível dissipar os subsídios introduzidos e então, caso necessário, ativá-los novamente.

A queda recente do preço do petróleo mostra que uma indexação instantânea de preços a variações de curto e médio prazo pode ser precipitada, ao menos em termos macroeconômicos.

Como ação estruturante, o governo brasileiro deve trabalhar na direção de prover mais e melhores bens e serviços públicos.

A provisão de educação e saúde públicas, universais e de qualidade é uma forma de barateamento da cesta de consumo dos assalariados, uma vez que eles podem passar a adquirir esses serviços gratuitamente, reduzindo a pressão sobre o salário monetário.

A mobilidade urbana é mais um flanco de atuação. Com sistemas de transporte mais eficientes, reduz-se o custo médio do Km rodado, o que, a princípio, reduz o preço da passagem. Outro fator central é a própria retomada do crescimento econômico, que tende a elevar os ganhos de produtividade.

De todo modo, a conservação e a expansão dos ganhos distributivos não passam pela redução da atuação do Estado brasileiro, mas sim por sua ação eficiente na consolidação do welfare-state tropical em construção no Brasil.

REFERÊNCIA:

SUMMA, R. (2014) Mercado de trabalho e evolução dos salários no Brasil. Texto para Discussão n° 13, IE UFRJ, 2014. (Disponível AQUI).

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