O 45° ENECO (Encontro Nacional de Estudantes de Economia), realizado na cidade de Ilhéus-BA, na Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), entre 13 e 20 de julho, reuniu mais de 650 congressistas de todas as regiões do Brasil, e teve como marca a diversidade intelectual, cultural, política e econômica. Estiveram presentes 55 instituições de ensino superior, sendo 42 públicas e 13 privadas. Durante o encontro, a geopolítica e o desenvolvimento socioeconômico, compreendidos como uma dança em descompasso no Brasil, foram temas norteadores, conduzindo o debate sobre a fragilidade da atividade econômica, seus efeitos sobre a desigualdade social e como o conjunto da sociedade pode atuar para melhorar este cenário.
Em 2018, a população brasileira depositou grandes expectativas na superação da crise econômica que o país enfrenta nos últimos anos, ao eleger um novo governo. Entretanto, passados mais de 200 dias, este até agora se mostra incapaz de corresponder a essas expectativas com eficácia. Ao contrário, tem se esforçado em descontinuar conquistas históricas nas relações exteriores e semear a divisão no país.
É importante observar que a manutenção de taxas básicas de juros elevadas para o contexto internacional (entre 3% e 4% em termos reais) está prejudicando a retomada do crescimento do país, não fomentando o investimento de capital fixo, que é o maior gerador de novos empregos, e freando a demanda agregada financiada, como a típica dos bens duráveis e de investimento. O Relatório Focus, conduzido pelo Banco Central, tem anunciado quedas consecutivas para o crescimento do PIB real (já é a vigésima previsão de redução), e até o mercado financeiro, fiador das reformas regressivas e recessivas, faz críticas ao governo. Afirma que este não está sendo realista e cria, com isso, uma alta desconfiança do mercado. No cenário internacional não é muito diferente, pois o governo tende a acatar as demandas externas que conflitam com as necessidades reais da população.
Embora recentemente a BMF&BOVESPA tenha batido recordes, segundo o Instituto Brasileiro de Economia (IBRE/FGV), o investimento público atingiu a menor taxa de formação bruta de capital fixo dos últimos 50 anos, recuando para 15,5 % do PIB no fim do primeiro trimestre do ano de 2019, ante seu pico na conjuntura 2008-2014. O que prova a inabilidade das políticas econômicas recentes de Temer e Bolsonaro em criar um novo círculo virtuoso de emprego, renda e investimentos.
Segundo o IBGE, no fim do primeiro trimestre de 2019, o desemprego atingiu alarmantes 13 milhões de pessoas, o que equivale a 12,3% da população brasileira economicamente ativa. Neste sentido, o Governo Federal não tem apresentado medidas eficazes para reverter a crescente do desemprego em nosso país, e a reforma trabalhista implementada pelo governo anterior não mostrou resultados na qualidade de trabalho brasileiro, e sim um aumento da informalidade. Conforme os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), 1 a cada 4 pessoas trabalham na informalidade. Neste sentido, as reformas na área trabalhista, previdenciária e dos gastos primários vêm intensificando a tensão entre o mundo do trabalho e da produção com o financeiro e com o empresarial sem visão de desenvolvimento. Diante deste cenário, das discussões travadas nos últimos meses e no ENECO 2019, repudiamos a proposta de reforma da previdência difundida pelo atual governo como uma solução imediata para a crise brasileira, pois a mesma não promove a equidade, é excludente, prejudica os trabalhadores e dificulta o combate à desigualdade no país.
A defesa de uma universidade autônoma, livre, democrática, gratuita e de qualidade, está entre os princípios fundamentais da nossa organização representativa, Federação Nacional de Estudantes de Economia. Preocupa a todos nós a agenda que o Ministério da Educação vem desenvolvendo, como a nomeação de reitores interventores não democraticamente eleitos por suas comunidades acadêmicas, ferindo gravemente a autonomia das universidades. Por essa razão nos solidarizamos com a Universidade Federal da Grande Dourados, a Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro e a Universidade Federal do Triângulo Mineiro.
Reiteramos que somos veementemente contra as restrições orçamentárias sofridas na educação, que no último dia 16 de julho já causou o corte de energia da Universidade Federal do Mato Grosso, obrigando-a a suspender as atividades. Outras universidades Brasil afora já sinalizaram que não há como retornar às suas atividades ou funcionar plenamente no segundo semestre, em virtude dos orçamentos comprometidos. Destacamos que as universidades públicas respondem por mais de 95% da produção científica do Brasil, segundo a Academia Brasileira de Ciências, além de representarem uma das grandes ferramentas para o desenvolvimento do país e para a redução da desigualdade social.
Conclamamos a sociedade brasileira a juntar se a nós num gesto de protesto contra o conjunto de concessões e privatizações de setores estratégicos, que vêm sendo realizadas pelos últimos governos brasileiros, e que representam importantes mecanismos de soberania nacional. Um exemplo é a fusão entre a BOEING e a EMBRAER que já no dia 02 de maio encerrou as atividades de uma importante fábrica na cidade de São José dos Campos-SP, colocando em insegurança mais de três mil postos de trabalho, levantando questionamentos por parte do Ministério Público do Trabalho. Estão no alvo ainda campos de petróleo do pré-sal, as concessões do complexo aeroportuário nacional, os Correios e outras empresas públicas.
Em virtude dos fatos mencionados acima, trazemos esta carta ao povo brasileiro, para compartilharmos nossas preocupações e apontarmos algumas direções que podem mudar o curso em que se encontra o Brasil. Ressaltamos a necessidade da elaboração e apresentação de um plano nacional de desenvolvimento. Para isso, é necessário urgentemente a retomada do investimento público para sinalizar uma mudança na condução das políticas econômicas do país, estimulando o mercado nacional e promovendo o aumento das expectativas de ganho. Para tanto, é necessário um amplo diálogo com a sociedade para propor um conjunto de reformas estruturantes como a reforma tributária, que tribute lucros e dividendos para ser mais equitativo, tributando progressivamente, e que ajude o Brasil a ser um país mais justo, menos desigual, mais sustentável e solidário.
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