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Econofísica ou física social

O sonho de economistas idólatras do livre-mercado sempre foi a ciência econômica ter o status da física para obterem o prestígio científico dos físicos. Hoje, pragmaticamente, muitos físicos almejam trocar sua sapiência pela remuneração dos economistas no mercado financeiro.

A vanguarda teórica dos economistas, por sua vez, deseja desenvolver uma física social de modo a ampliar o pensamento socioeconômico e político, incluindo não apenas forças competitivas, mas também trocas de ideias, informações, pressão em busca de status social etc., a fim de explicar melhor o comportamento humano. Ela busca explicar como as interações sociais afetam as metas e decisões individuais e como esses efeitos sociais geram a auto-organização dinâmica da economia como um sistema complexo.

Busca entender como das interações sociais dos componentes sistêmicos, desde os agentes até a comunidade, o mercado e o Estado, emerge uma sociedade conectada em rede. A dependência de trajetória caótica se afasta das condições iniciais sem destino pressuposto para um futuro equilíbrio entre todos os planos dos agentes econômicos e a disponibilidade de recursos. Substitui a ideia propiciada por “a mão invisível do mercado” de haver uma reversão ao equilíbrio – e não uma competição sem fim.

Evidentemente, essa metáfora de “a mão invisível do mercado”, publicada por Adam Smith em 1776 (data da Revolução Americana), em Uma Investigação sobre a Natureza e as Causas da Riqueza das Nações, foi inspirada na Lei da Gravitação Universal. Quando dois agentes possuem bens ou serviços para troca, ambos sofrem uma força de atração mútua proporcional às suas forças de mercado e inversamente proporcional à distância entre si. Essa lei, formulada pelo físico inglês Isaac Newton, e anunciada em 1687 (véspera da Revolução Gloriosa inglesa), em conjunto com as três leis dos corpos em movimento se tornaram os fundamentos da mecânica clássica.

Newton ainda construiu todo o arcabouço matemático necessário – o cálculo diferencial e integral – para economistas imaginarem a la físicos projetar e construir sistemas mais eficientes. Conhecida como o Princípio da Inércia, a primeira lei de Newton sugere: se a força resultante de todas as forças de mercado agindo é nula, logo o ritmo de crescimento do preço ou cotação é inercial ou constante. Pela segunda lei, a taxa de variação de uma cotação é igual à resultante de todas as forças exógenas a ela aplicadas.

A terceira lei, ou Princípio da Ação e Reação, sugere a força de mercado representar a interação mercantil entre dois agentes ou partes distintas de uma economia. Se um exerce uma força em outro, este simultaneamente reage exercendo uma força de mesma magnitude no primeiro. Em um mercado competitivo, ambas as forças seguiriam na mesma direção, contudo em sentidos contrários. Embora as forças sejam iguais, as acelerações de ambos não o são necessariamente: quanto menor a massa de capital, maior será sua aceleração relativa. É matemático.

Dessa forma simples, as forças no mercado aparecem sempre aos pares. Não há força solitária, ou seja, não há nenhuma força real sem a sua contraparte. Toda a ação deve se desenvolver pelo contato mercantil e a reação da contraparte. Os indivíduos “atomizados” não são afetados pela ação. Esta se resume às premissas neoclássicas a eles atribuídas: racionais, atomistas, dotados de informações perfeitas (e não privilegiadas), para a maximização de todos. Jamais alteram o seu comportamento na interação com os outros dotados da mesma “racionalidade” comportamental.

O nome “Física Social” tem uma longa história desde o século XVIII. Ao usar a analogia com a física newtoniana, a sociedade foi conceituada pela ciência econômica como uma vasta máquina. Mas a sociedade simplesmente não é tão maquinal ou mecânica.

Física social é uma ciência social quantitativa. Ela se propõe a descrever conexões matemáticas entre fluxo de informações e ideias, por um lado, e o comportamento das pessoas, por outro. Ela nos ajuda a entender como as ideias fluem de pessoa a pessoa através do mecanismo de aprendizagem social e como esse fluxo de ideias acaba moldando as normas, a produtividade e a produção criativa das sociedades.

Como um exemplo de física social em ação, considere o comportamento dos operadores do mercado de capitais. Eles compartilham dicas em uma rede social. Há momentos quando muito poucos traders (insiders) lucram muito. São resultados ruins para os demais traders (outsiders), e seus corretores. Estes perdem seus negócios quando esses amadores desistem. Logo, os corretores e agentes autônomos tentam melhorar o conhecimento e a experiência dos amadores para os “profissionalizarem”.

Market timing é um tipo de estratégia comum para se investir em ações. É o ato de tentar comprar ativos na baixa e vender na alta. Consiste em uma análise dos investidores com o objetivo de prever os passos de O Mercado divino ou sobrenatural (onipotente, onisciente e onipresente) — e obter lucro com esta análise.

Tipicamente, o market timing se utiliza do cenário de todo o mercado para prever as tendências. Esta estratégia não costuma focar em um ativo específico, mas sim no movimento do mercado como um todo, ou seja, avaliar a psicologia de massa.

A análise técnica estuda os padrões de mercado e a oferta e a procura de ações, prognosticando as probabilidades do curso das cotações. Tem pouco fundamento teórico além das afirmações banais do princípio da ação e reação – os preços das ações serem determinados pela oferta e procura – e do princípio da inércia – a experiência do passado recente ser importante no prognóstico do futuro próximo.

Para ser útil às finanças comportamentais, a análise técnica teria de ser vista como reflexo de psicologia social aplicada. Seu objetivo teria de ser a identificação de tendências e mudanças no comportamento das multidões, ou seja, a emergência de cotações pelas interações da massa de indivíduos.

O que interessa às finanças comportamentais são como os fatores de oferta e demanda de mercado são capazes de entender e traduzir a “psicologia” do mercado. O Mercado (assim com letras maiúsculas como God) corresponde à soma dos desejos, medos e expectativas de seus participantes, isto é, pessoas.

Já os analistas fundamentalistas agem, basicamente, como os economistas. Utilizam-se de informações econômicas e históricas. Incluem todos os determinantes primários de preços: análises das empresas, setoriais e macroeconômicas.

Contrastam com os analistas grafistas, porque estes se comportam tal como os físicos. Buscam tirar vantagem da segunda lei do movimento: os preços se movem segundo tendências. Daí, descartam todos os fatos sobre o ativo, exceto a sua história de preços.

Hoje, os algoritmos são responsáveis pela maioria das transações com ações e derivativos. Depois de alimentar os softwares com certos parâmetros estatísticos, os computadores dispensam a ação humana para disparar ordens de compra e venda de ativos. Seguem sequência de comandos, isto é, o algoritmo, para identificar ínfimas distorções de preços dos ativos e fazer as operações de arbitragem automaticamente.

Conectados a sistemas de transmissão de dados rápidos, esses sistemas de alta frequência negociam os papéis com velocidade incapaz de algum investidor atingir. Como os ganhos por transação são pequenos, para faturar alto fazem grande volume de operações em frações de segundo, turbinando a movimentação total nas bolsas.

As estratégias de algoritmos incluem desde operações triviais como adquirir certa ação com cotação determinada, até transações reativas, quando disparam compras quando alguma ação atinge certo volume de negociação. Para resguardar a segurança dessas ordens, os operadores da corretora não podem ter acesso às transações efetuadas pelos sistemas de algoritmos. Há “chinese wall” para evitar informações privilegiadas e garantir a privacidade do investidor.

Em fundos hedge, há o rastreamento das tendências. Ter como meta um nível específico de “volatilidade administrada” – dimensionar a exposição com compra na baixa “calma” e venda na alta “turbulenta” – está entre as estratégias conhecidas como “paridade de risco”. A teoria desta é que, com o tempo, uma carteira grande e diversificada de ativos, equilibrada pelo risco matemático (na prática, a volatilidade dos rendimentos esperados) de cada um, vai ter retornos melhores em lugar de um portfólio tradicional.

Muitos investidores e analistas culpam as estratégias de algoritmos, ao ajustarem automaticamente sua exposição ao mercado de acordo com a volatilidade, por agravar os “flashes crashes”. As operações automatizadas dos “físicos” têm sido denunciadas, ocultando a crescente ansiedade com a piora dos fundamentos, anunciada por “economistas”.

O medo diante das máquinas está entranhado na psique humana. A “aversão a algoritmos” leva as pessoas a confiarem instintivamente mais em projeções de humanos do que na dos algoritmos, mesmo depois de verem os “algos” cometerem menos erros de previsão e erros menos graves, se comparados aos dos economistas.

Crédito da foto da página inicial: Agência Brasil

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