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Foto do escritorBrasil Debate

Donald Trump e os conflitos entre gerações

“Como ele foi parar lá?” Essa pergunta, quando formulada às pressas, deixa escapar a descrença dos altivos “analistas de primeiro mundo” acostumados com as personagens caricatas da ralé mundial.  “Este não é o ano para pureza ideológica. Não vote em Jill Stein”, adverte Jill Abramson, jornalista e analista de política do The Guardian, bradando contra os chamados third parties e relembrando que se os votos conferidos a Ralph Nader tivessem sido direcionados a Al Gore em 2000, talvez – e apenas talvez –, teríamos sido poupados da Guerra do Iraque e de outras atrocidades da era Bush II.

Parece ser preciso fazer tudo o que está ao nosso alcance para impedir uma reviravolta traumática na 58a eleição presidencial dos EUA, ainda que isso signifique votar em Hillary Clinton. Mas o que está por trás da polarização dos candidatos a inquilino da Casa Branca? A nossa incapacidade de enxergar o que salta à vista.

Ambos os candidatos, a democrata Hillary Clinton e o republicano Donald Trump, apresentam os maiores índices de rejeição a presidenciáveis de seus partidos das últimas dez eleições. O ódio que Trump costuma lançar às minorias – hispânicos, muçulmanos, afro-americanos, e outros grupos (que por ingratidão divina também são votantes!) – parece voltar em dobro para si e, entre março e abril do ano eleitoral, seu índice de rejeição alcançou a majestosa marca de 53%.

Nem tão depressa com a champagne, alguém deve lembrar Hillary que para ela a marca é de 37%. Por outro lado, entender o que está por trás dessas eleições faz com que tenhamos que ir além da lógica de Talião, e recorramos à psicologia de bordel, aquela muito citada e pouco compreendida, e que vez ou outra nos coloca contra nossos entes paternos.

A pesquisa do economista Jonathan Rothwell do Instituto Gallup desmistifica quem é o eleitor de Trump e o retira da tão desprezada “América profunda”, categoria imaginária que se refere ao perfil LMW (lower middle class – male – white). Os eleitores que possuem uma opinião favorável sobre Trump são ligeiramente mais propensos a estarem empregados, as taxas de desemprego globais são de 3,2% para os favoráveis a Trump versus 3,9% para os contrários ao republicano.

A porcentagem de adultos com menos de 65 anos que está fora da força de trabalho é 20% para ambos os grupos. Por outro lado, a maioria dos que têm uma opinião favorável sobre Trump não possui ensino superior (73% vs. 65%), mas possuem rendimentos (não-ajustados) superiores em cerca de 6%. Dessa forma, o estudo conclui que a popularidade de Trump não pode ser perfeitamente conectada às dificuldades econômicas de seus eleitores.

Não apenas há diversas lacunas no perfil comumente desenhado para o eleitor de Trump, como muitos analistas estão fazendo diagnósticos com base nas questões erradas. O alarme antiglobalização soou e todos nós olhamos para o emprego, ou melhor, “os empregos roubados pelos imigrantes”, como uma das questões-chave para o eleitor de Trump.

Imaginamos que ‘Make America Great Again’ é um slogan imperioso porque remete ao passado, quando na verdade seu efeito surpreendente é sentido por ressoar nas relações (e conflitos) entre gerações. Voltando-se para o futuro, o slogan vem acompanhado de um tímido “para quem?” e traz uma nova forma de patriotismo moderna, o espírito do patriota-consanguíneo.

As evidências do estudo de Rothwell mostram um eleitor pró-Trump preocupado com as expectativas de vida e de oportunidades. Os filhos ganharem menos que os pais, como Rothwell mostra ser o caso das regiões onde Trump é mais popular, é a típica frustração de expectativas que faz qualquer progenitor aceitar o magnata como ele é. É como o dramaturgo da zona norte carioca já dizia: Dinheiro compra até amor verdadeiro.

Para Freud nenhum botar defeito, a publicação do último domingo do USA Today/Rock the Vote Poll mostra que um grande muro separa o candidato Donald Trump, não da fronteira com o México, como o mesmo pretensamente deseja, mas dos jovens votantes com menos de 35 anos de idade. Desses, apenas 20% votam no candidato republicano, enquanto 56% votam em Hillary Clinton. A maior preocupação da democrata é não deixar o entusiasmo que o senador Bernie Sanders trouxe às eleições se esvair (em março, quando o mesmo ainda disputava as eleições, 76% dos jovens votantes estavam dispostos a romper com a inércia da “realidade aumentada” e retornar à cruel realidade 1:1, enquanto em agosto, com Hillary já como candidata, esse número caiu para 72%). Estima-se que o número de Millennials, algo em torno de 75,4 milhões, já tenha ultrapassado os membros da geração Baby Boom que hoje caminha para os 51-69 anos de idade.

Mais do que uma questão quantitativa, trata-se do rompimento de uma longa cadeia que vincula pais e filhos, alimentada pelo desejo narcísico para o qual a criança é tida como o elo seguinte portador da esperança de autoduplicação. Mas frustrar as diversas expectativas criadas com a filiação é quase inevitável, e conforme o fantasma da criança transforma-se em indivíduo autônomo, e votante, ao que parece a decepção virá em dobro – os jovens podem acabar com menores salários e votando em Hillary Clinton.


grafico trump x clinton

Crédito da foto da página inicial: Getty/indy100.independent.co.uk

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