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  • Foto do escritorBrasil Debate

Desde o século 19, as brasileiras lutam por direitos políticos

O sistema eleitoral brasileiro não é para os fracos. Pelo contrário, é para as fortes. A luta das mulheres brasileiras pelos seus direitos políticos se estende desde o final do século 19, e o Brasil quase foi o primeiro país a ter o sufrágio feminino, em 1890. No entanto, o que nossa história mostra é que, como todas as outras coisas, até por isso a mulher brasileira precisa batalhar, e muito.

1891 – 1932: Mulheres completamente ignoradas do sistema político brasileiro

A Constituição de 1891 acabou por omitir a existência das mulheres enquanto pessoas políticas – nem mesmo proibidas de votar elas foram. Algumas exploraram essa omissão, demonstrando judicialmente que, se não estavam proibidas, estavam permitidas. A exclusão das mulheres do processo eleitoral faz com que as brasileiras nunca tivessem que lidar com o sistema eleitoral majoritário, similar ao dos EUA e do Reino Unido, que, por ser focado em representação geográfica e, em geral, ter um representante por distrito, tende a ser extremamente excludente.

1932-1945: Pequeniníssimos passos para os direitos políticos da mulher

O Código Eleitoral de 1932 continuou delegando às mulheres um não-lugar no sistema político quando facultam ao universo de mulheres o voto. Esse posicionamento oficial do estado brasileiro é extremamente problemático, já que não considera o voto feminino central para o bom funcionamento da democracia instituída, além de desincentivar institucionalmente a presença de mulheres no pleito.

A Constituição de 1934 dá um minúsculo passo em relação à expansão do voto feminino, determinando que o alistamento é obrigatório para mulheres que exerçam cargo público remunerado. Nesse período também é instituída a representação proporcional, uma forma mais inclusiva de contabilização dos votos por tirar o foco da localidade a favor de ideias e programas.

1945-1965: Enfim direitos políticos para mulheres! Mas não se anime, só para aquelas que exercem atividade lucrativa

Parece piada de mau gosto o que o Decreto-Lei Nº 7.586 e o Código Eleitoral de 1950 reservavam às mulheres. O voto se tornou obrigatório para todas as mulheres que exerciam função lucrativa. O que, de fato, trouxe um baixíssimo impacto na presença de mulheres no pleito eleitoral, já que a grande maioria de mulheres exercia trabalhos domésticos e não-lucrativos. Para homens não havia cláusulas que facultasse o voto. O machismo institucional se dá nos detalhes.

1965-2017: Garantindo voto obrigatório para as mulheres

Interessante ver que é na ditadura militar que o voto obrigatório é instituído tanto para homens quanto para mulheres. Entende-se por que o voto obrigatório é tão facilmente associado à falta de liberdade, mas, de fato, a obrigatoriedade do voto toma outra perspectiva quando entendemos que isso também significa uma obrigatoriedade para o Estado. Ou seja, o Estado deve garantir acesso às urnas a toda a população e um sistema que seja minimamente responsável e responsivo, mas garante-se também a segurança do voto secreto e inalienável.

O sistema atual

Atualmente o Brasil faz uso da seguinte combinação de regras: representação proporcional, lista aberta, distritos de médios a grandes e cotas eleitorais de gênero. Essa combinação tem provado ser extremamente desfavorável para as mulheres, já que, com as cotas, veio o aumento no número de candidaturas que cada partido pode apresentar (1,5 vezes o número de cadeiras para partidos; 2 vezes o número de cadeiras para coligações).

Esse aumento quase anulou o efeito da cota, não havendo impacto algum em como os partidos escolhem suas candidaturas ou como as apoiam. Na verdade, como o voto em uma candidatura conta para a legenda, para um partido, quanto mais candidaturas, melhor. O que decidem eleições no Brasil são alianças partidárias internas e informais, às quais mulheres não costumam ter acesso. As mulheres, então, se perdem num “mar de candidaturas”, precisando gastar muito mais por menos votos.

O mundo ideal

Sistemas eleitorais são como digitais: cada país tem o seu, de acordo com a sua história, seu contexto e a população a ser representada. No entanto, existem várias pesquisas e avaliações que demonstram quais são as medidas eleitorais ideais para a representação de minorias políticas. No caso brasileiro, existem algumas reformas que seriam essenciais. A primeira seria uma reforma do financiamento eleitoral. Atualmente, o teto das doações privadas é determinado de forma proporcional à renda – mas a desigualdade econômica no Brasil faz com que isso seja uma regra que facilmente favorece os mais ricos. O ideal seria um teto nominal baixo, ou seja, o mesmo valor para todo mundo, mantendo a exclusão de doações por pessoa jurídica.

Além disso, o sistema de doações merece uma boa simplificada: por cartão de crédito, débito, paypal, pagseguro, transferência bancária. Transações financeiras rastreáveis, imediatamente jogadas em um sistema online do TSE. Infelizmente, isso ainda exclui boa parte da população brasileira que não tem acesso à internet ou mesmo a uma conta bancária. Mas essa se tornando uma fonte de renda importante, é bem possível que a bandeira da internet para todxs (uma bandeira da presidenta Dilma Rousseff, por sinal) seja algo que os partidos resolvam apoiar.

A melhor opção em termos de modo de votação e que poderia trazer vários outros benefícios ao sistema político brasileiro seria o fechamento da lista com alternação de gênero (ou alguma forma de lista flexível). Fato é que o Brasil é o único país dessa magnitude a usar a lista aberta e mesmo os países que a têm como opção raramente veem votos sendo dados a candidatxs individuais.

No entanto, essa seria uma modificação extrema e exigiria que tanto partidos, quanto polítcxs, quanto a população se adequassem a um sistema completamente novo. Uma opção seria a reserva de assentos, que atualmente está proposta na PEC 134, apoiada consensualmente pela Bancada Feminina – e que não vai ser votada tão cedo. A PEC, na verdade, não tem nada de radical. Reserva, por um tempo, assentos para mulheres nos legislativos do país de forma progressiva: 10%, 12%, e 15%, sucessivamente. Talvez fosse mais fácil que os partidos simplesmente seguissem a cota de 30%, desde que modificações no financiamento fossem feitas. Mesmo assim, a quantidade de candidaturas permitida é absurda, afetando consideravelmente as candidaturas femininas.

Por último, a diversidade no Brasil não para em diversidade de gênero. No mundo, são 28 países que fazem uso de cotas raciais ou étnicas. Apenas 17 possuem cotas de gênero e raciais/étnicas; somente quatro organizam essas cotas de forma a garantir que mulheres não-brancas sejam eleitas. O sistema eleitoral no Brasil precisa de uma reforma que garanta a presença de indígenas e negrxs, grupos sociais sistematicamente discriminados neste país.

Enquanto o sistema eleitoral brasileiro privilegiar os grupos sociais que sempre foram detentores de poder no país, é difícil imaginar alguma mudança positiva num futuro próximo. Neste Brasil pós-golpe, em pleno desmonte de direitos, estamos em uma máquina do tempo que só vai para trás, revivendo exclusões, marginalizações e violências que pensávamos estarem no passado, nos anos de chumbo, no café com leite.

A luta continua!

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