Governada pelo PT, Corumbá, no Mato Grosso do Sul, é considerada uma referência do Programa Mais Médicos. Um ano depois da implantação do programa, o município comemora um salto qualitativo nos indicadores de saúde pública que beneficiou seus 107.347 habitantes.
O primeiro balanço do Mais Médicos realizado pela Secretaria de Saúde de Corumbá revela que a administração de medicamentos em atenção básica (por paciente) subiu mais de 400%. Já as internações motivadas por diabetes registraram uma queda de 66%, enquanto as que tiveram como causa pressão arterial diminuíram em mais de 21%.
Outros números reveladores: nesse período, houve um aumento de 46% no número de consultas a crianças com menos de um ano, de mais de 65% nos atendimentos de pré-natal e uma queda de 25% no número de abortos espontâneos.
A secretária conta, ainda, que, a exemplo do que aconteceu em outros municípios brasileiros, em Corumbá, o Mais Médicos foi duramente criticado pelas entidades médicas da cidade. Apesar disso, só vem ouvindo elogios por parte da população. “Com a implantação do Mais Médicos temos escutado os pacientes dizerem: ‘agora somos ouvidos, o médico me examina, toca em mim’”, diz ela.
A seguir, a entrevista concedida a Joel Santos Guimarães:
Quando o programa Mais Médicos foi lançado pela presidenta Dilma, houve uma reação corporativa das entidades médicas brasileiras, que criticaram o programa e a contratação de médicos estrangeiros, cubanos principalmente. Isso também aconteceu em Corumbá?
Sim. Eu avalio a reação corporativista como um tremendo equívoco, e tenho debatido sobre isso com os colegas médicos. Tenho 30 anos de trabalho na saúde e isso é lamentável. Digo que é por preconceito, falta de informação, prefiro pensar assim para não confrontar.
Em Corumbá, não foi diferente, mais buscamos dialogar e mostrar o porquê da necessidade do programa, e ainda sentamos com os profissionais e pactuamos a revisão do Plano de Cargos – o piso do médico que era de R$ 3.600,00 passou para R$ 5.000,00.
Antes do programa, com quantos médicos contava a rede pública de saúde de Corumbá?
Antes do Mais Médicos, a cobertura era de menos de 50% e o município tinha cinco profissionais médicos concursados para a atenção básica e os outros tinham contratos temporários e não atendiam somente na unidade de ESF (Equipe de Saúde da Família), atendiam também no SAMU e Pronto- socorro. Hoje, estamos com uma cobertura de 69,5%.
Qual era o número de consultas diárias? E o tempo de duração por consulta?
Tempos difíceis. Eram realizadas de 12 a 16 consultas em mais ou menos duas horas, não tinha atendimento todos os dias. Na média, três vezes na semana na zona rural, e distrito um dia por semana. Corumbá tem um número reduzido de médicos, para atender a rede privada e ao Sistema Único de Saúde. Ainda hoje temos dificuldade de fechar escala para o Pronto-socorro e SAMU.
Com o programa, houve alteração nesse quadro? As consultas deixaram de ser consultas relâmpago? Os pacientes têm um atendimento de melhor qualidade?
Com certeza, o atendimento da equipe agora é integral, dentro dos parâmetros preconizados. E temos escutado dos pacientes: “agora somos ouvidos, o médico me examina, toca em mim.” Importante colocar que não culpamos os profissionais brasileiros, mas a demanda é gigantesca para poucos profissionais.
Como os médicos cubanos foram recebidos pela população? Eles se adaptaram?
Os médicos foram muito bem recebidos em nosso município, tanto por nossa parte como por parte dos usuários, e a língua não tem sido um empecilho. A adaptação tem sido fantástica. Eles estão integrados, participam das atividades sociais.
Corumbá é uma referência do Mais Médicos, em todo o Brasil. Como foi possível chegar a esse patamar?
Chegamos até aqui porque, primeiramente, acreditamos no programa. E a partir daí fizemos os enfrentamentos necessários, com muito diálogo, e, principalmente, trabalhando com disciplina e envolvendo todos os profissionais na construção do SUS que dá certo.
O Mais Médicos veio complementar outros programas do município que têm por objetivo melhorar a saúde pública? Que programas sãos esses?
O programa oportuniza não somente a Corumbá, mais ao Estado de Mato Grosso do Sul, a qualificação da Atenção Básica. Hoje podemos afirmar que estamos num novo processo de rediscutir a qualificação da prevenção e promoção da saúde.
A senhora poderia contar como era a saúde pública antes do Mais Médicos e como ela é agora?
Corumbá é o quarto município em população do Estado de Mato Grosso do Sul, com 107.347 habitantes, e o primeiro em extensão territorial. Ocupa mais de 20% do Estado. Por essas dimensões, há locais no município, como distritos e assentamentos, a 70 km de distância a zona urbana, e populações ribeirinhas a quase 300 km de distância de percurso fluvial.
O município ainda ocupa a 16ª posição em IDH – Índice de desenvolvimento Humano e apresenta o terceiro lugar em participação interna bruta do Estado.
A rede pública de serviços de saúde do município, em especial relacionada à básica, possui 23 equipes de atenção básica, das quais 21 são de Equipes de Estratégia de Saúde. Antes do Mais Médicos, o município possuía 62% (número que na realidade era fictício porque o médico não estava presente todos os dias na unidade) de cobertura em atenção básica e atualmente encontra-se com 69,5% de cobertura.
Quais são os resultados do Mais Médicos no município?
A hipertensão é a segunda causa de morbidade hospitalar no município de Corumbá (Corumbá, 2013) e, ao avaliar os resultados, o Mais Médicos apresenta consideráveis avanços: hipertensos acompanhados aumentaram em quase 10%, o que significa 352 acompanhamentos a mais; portadores de diabetes acompanhados aumentaram 17%, o que significa 187 acompanhamentos a mais.
Ou seja,hoje esses pacientes têm acompanhamento do médico no bairro – por uma equipe de Saúde da Família, em consequência, diminuiu a internação hospitalar e até casos de morte, porque sua doença tem acompanhamento rigoroso pela ESF. Com o Mais Médicos houve uma redução em mais de 66% de internações por complicações motivadas por diabetes, e hipertensão arterial em mais de 21%.
E com relação à saúde da mulher?
Houve avanços significativos, como a expansão em mais de 16% de acompanhamento de gestantes, representando aumento de 50 consultas por mês. Os atendimentos de pré-natal elevaram-se em mais de 65%, com o aumento de 425 consultas. Importante destacar que houve uma queda de 25% no número de abortos espontâneos.
E as crianças?
Foi na área estratégica da saúde da criança que observamos os resultados mais marcantes: aumento de mais de 46% de consultas para crianças menores de um ano, representando mais de 145 consultas por mês. O mesmo se repete na faixa etária de 1 a 14 anos, com um aumento de 32% representados por mais de 325 consultas por mês. Diminuição de mais de 36% de internações por doenças do aparelho respiratório (destacamos pneumonia, asma e bronquite) em menores de um ano e com redução de 15% na faixa etária de 1 a 14 anos.
A situação dos idosos também melhorou?
Houve um aumento de mais de 33% de consultas para a população acima de 60 anos; redução da morbidade referente a doenças do aparelho circulatório em quase 8% (no caso de doenças hipertensivas em mais de 65%). Redução da morbidade referente a doenças do aparelho respiratório em 5%.
O número de consultas básicas aumentou?
Sim. Em 32%. Desde a implantação do Mais Médicos em Corumbá houve também um crescimento de mais de 13% de atendimentos domiciliares e um aumento de administração de medicamentos em atenção básica (por paciente) em mais de 400%. Importante destacar a redução de doenças infecciosas e parasitárias de mais de 22% (só diarreia e gastroenterite a redução foi de mais de 30%) e a redução de doenças do aparelho respiratório em 22,22%.
Quantos médicos fazem parte do programa? Quantos brasileiros, quantos estrangeiros e quantos cubanos?
Hoje temos três médicos brasileiros – CRM/Brasil, duas brasileiras formadas no exterior -, dois profissionais da Espanha, dois da Argentina, um venezuelano (formado em Cuba) e 15 cubanos.
Crédito da foto da página inicial: Clovis Neto
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