São historicamente conhecidos os desafios pelos quais passam a agricultura familiar brasileira, especialmente aquela localizada no sertão nordestino e Norte de Minas Gerais, locais onde a seca e a pobreza sempre se fizeram presentes, bem como a forma de produção baseada nesse tipo de agricultura.
Dentre as estratégias de desenvolvimento rural desde os anos 1990 vem se destacando o crédito fundiário (para saber mais, acesse o Programa Nacional de Crédito Fundiário), que financia agricultores com pouca ou nenhuma terra tanto para adquirir um lote, como para realizar as melhorias necessárias. Entretanto, para obter acesso ao crédito, é necessário que esses agricultores estejam organizados em associações e que possuam área coletiva produtiva, o que inclui o caráter associativo ao programa e coloca como um dos seus pilares a formação de capital social.
Capital social provém dos ativos oriundos das relações sociais, sejam eles financeiros ou não. Para avaliar o desempenho de programas com características tão subjetivas os desafios são constantes, pois a captação desse elemento – capital social – não é de fácil compreensão.
Geralmente o capital social irá se desenvolver através da constituição de vínculos sociais que podem ser desvendados ao se perceber que os mesmos se caracterizam por meio de redes sociais. Nesse sentido, essa metodologia pode ser interessante e foi utilizada na tese de doutoramento da autora desse texto, em que se colocou o desafio de avaliar programas de crédito fundiário no sertão Baiano e no Norte de Minas Gerais utilizando o NetMap, metodologia inovadora construída através de uma rede egocêntrica, que tem como foco da entrevista um agente centralizador (na pesquisa foram realizadas entrevistas semiestruturadas em oito projetos distintos com os presidentes das associações ou comissões de várias pessoas), a fim de desvendar todos os agentes envolvidos nos projetos, desde bancos até outras associações, igrejas, organizações comunitárias, todo o escopo governamental etc.
Após a coleta das informações e com o mapa completo, foi possível diferenciar as relações por tipos e por pesos diferentes, encontrando agentes que proporcionam coesão, divergência, relações comerciais, financeiras, que se destacam em relação aos demais, entre outros.
Observando os resultados da pesquisa de campo, o mapeamento revelou forte relação entre os projetos vizinhos (como era o esperado), além da presença de igrejas, sindicatos rurais e uma grande rede de apoio comum, porém sem trocas financeiras. Vale destacar, no caso baiano, as melhores condições de infraestrutura (especialmente as rodovias) e a sempre presente atuação das três esferas de governo, inclusive com a criação de diversos vilarejos rurais, com escolas e postos de saúde.
Esse cenário infelizmente não se repetiu em Minas, onde as distâncias a serem percorridas entre os projetos e as cidades vizinhas ultrapassavam 70 km em estradas de terra em péssimas condições e geralmente com pouco aporte por parte das instituições responsáveis.
Foi possível apontar que os fatores determinantes para que os agricultores conseguissem superar sua condição precária anterior através da concessão do crédito e sua posterior capacidade de pagamento da dívida adquirida foram: um bom relacionamento com a esfera pública e a existência de um canal de escoamento para a produção.
Outro ponto importante foi a criação e especialmente a manutenção de áreas coletivas de produção entre os agricultores, pois os resultados mostram que, em sua totalidade, as áreas raramente se mantêm coletivas por mais de cinco anos, se subdividindo em áreas individuais.
As razões estão ligadas às divergências acerca do cultivo e do manejo das culturas ao longo do tempo, o que gerou conflitos entre esses produtores. No entanto, apesar de não ser determinante pelo aspecto produtivo, o trabalho coletivo é relevante para a resolução dos problemas diários e para a síntese das demandas dos envolvidos através das associações, desenvolvendo o seu papel, apesar de parcialmente.
É necessário ressaltar, também, que medidas relativamente de baixo custo podem auxiliar os projetos que permanecem em dificuldades para se desenvolver, entre elas: maior número de técnicos de assistência técnica, banco de dados sistematizado das condições produtivas e a inclusão dos produtores em feiras municipais e no Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) do governo federal.
Crédito da foto da página inicial: Dênio Simões/Agência Brasília/cc/EBC
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