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Crise do economista

Pós-tudo (e neonada), o economista deitou no divã. Quando são dolorosos ou inapropriados demais para que a mente consciente possa suportar, ideias, memórias e impulsos são reprimidos. Ficam armazenados no inconsciente, junto com os impulsos instintivos, no qual não são acessíveis pela consciência imediata.

O inconsciente dirige em silêncio os pensamentos e o comportamento do economista. Este só encontra alívio quanto permite às memórias científicas reprimidas virem à tona por meio da psicanálise. As diferenças entre seus pensamentos conscientes e inconscientes criaram uma tensão psíquica somente aliviada em encontros com o Dr. Sigmund Freud (1856-1939).

O economista adotou a ideia de Isaac Newton (1642-1727) da força centrípeta, alegando que qualquer movimento tem de ser resultado de uma força agindo sobre ele. Por que a maçã sempre cai para baixo, nunca para o lado, nem para cima? Tem de haver uma atração ao centro da Terra. Será que essa atração poderia se estender além da maçã e chegar até a lua? Se positivo, isso causaria a órbita da lua. Nesse caso, a força da gravidade afetaria tudo no universo. Até mesmo a “irrefreável” convergência da economia de mercado para o equilíbrio?!

As leis de Newton formam a base do que se refere como mecânica clássica. Forneceram um conjunto de equações usado para calcular os efeitos das forças do mercado em movimento. O economista, alegremente, incorporou tais ideias da Física do século XVII, juntando ainda ideias de John Locke (1632-1704) e de Adam Smith (1723-1790) no mesmo caldeirão em que cozinha sua “poção mágica”.

Os seres humanos são agentes racionais e independentes com direitos naturais. Eles se juntam a uma sociedade política para serem protegidos pelo Estado de Direito. O objetivo da lei é preservar e aumentar a liberdade. O governo deve apenas desenvolver boas leis que protegem os direitos do povo e as impor tendo o bem público em mente.

Tal Filosofia Política de John Locke tornou-se, desde sua época, conhecida como liberalismo clássico – a crença nos princípios da liberdade e da igualdade. As revoluções burguesas (com base de apoio popular) na Inglaterra (1642-1689), nos Estados Unidos (1776-1783) e na França (1789-1799) tinham como base os ideais liberais – proteção da vida, liberdade e propriedade –, então progressistas.

Porém, depois, os “liberais” não extinguiram a escravidão nem na América nem nas colônias francesas. Boicotaram a Revolução Haitiana (1791-1804), liderada por escravos. O direito ao voto conquistado pelas mulheres nos EUA em 1920, na Inglaterra em 1928 (por algumas mulheres acima de 30 anos em 1918), no Brasil em 1932 e na França em 1944, pelos negros norte-americanos, depois de muita luta civil, há apenas meio século.

O economista também herdou a ideia smithiana de “ordem espontânea” similar à causada por força da gravidade. Todo indivíduo age em interesse próprio. Isso pode levar a uma mistura caótica de produtos e preços em que pessoas interesseiras via competição tiram proveito da ganância alheia. Se um empregador paga salários abaixo do valor do mercado, outro vai contratar os empregados dele. Se um vendedor cobra caro demais, isto é, acima do valor do mercado, outros têm preços menores, e ele não venderá seus produtos. Logo, as empresas vão à falência se não pagarem os salários de mercado e não cobrarem por seus produtos o que O Mercado exige, ou seja, o preço que os consumidores se dispõem a pagar. A “mão invisível do mercado” impõe a ordem espontânea.

O economista recusou-se, talvez por preconceito religioso, a aceitar ideias de Charles Darwin (1809-1882), embora estas tivessem influência das ideias do colega Thomas Malthus (1766-1834). A maioria dos organismos produz mais progênies do que o número que consegue sobreviver, devido a restrições como escassez de alimento e espaço habitável. As progênies, variando entre si com pequenos desvios, afastam-se das condições iniciais em um processo cumulativo durante milênios. A Lei do Crescimento Acumulado de pequenas variações torna algumas progênies mais compatíveis ou mais adaptáveis à luta pela sobrevivência. Se esses indivíduos repassam traços vantajosos às suas progênies, estas também sobrevivem. Darwin intitulou esse princípio de “seleção natural”.

Thomas Piketty (1971) também usa a Lei do Crescimento Acumulado para, através da análise de dados estatísticos, provar que o capitalismo possui uma tendência inerente de concentração de riqueza em algumas famílias e seus herdeiros. Mostra que a taxa de acumulação de capital ou riqueza é maior do que a taxa de crescimento econômico da renda. Segundo Piketty, tal tendência é uma ameaça à democracia e deve ser combatida através da taxação de fortunas. Nesse sentido, é um economista evolucionário e/ou progressista, quase uma nova espécie que se afasta daquelas condições iniciais!

Finalmente, no século XXI, o economista encontrou Albert Einstein (1879-1955). Se a velocidade da luz através de um vácuo é imutável e as leis da Física parecem ser as mesmas para todos os observadores, então não pode haver tempo ou espaço absolutos. Observadores em movimento relativo, uns aos outros, vivenciam o espaço e o tempo de forma diferente. A Teoria da Relatividade mostra que não há simultaneidade absoluta entre eles.

Deitado no divã, em um processo de autoconhecimento, o economista entendeu que houve três estágios de evolução científica. Da hierárquica Ciência Aristotélica, em que “tudo vai para seu lugar natural”, evoluiu para a Física Newtoniana e a Teoria Política Liberal, em que agentes se movem em uma estrutura fixa com noção absoluta de espaço e tempo. Daí saltou-se para a Teoria da Relatividade e a Teoria Quântica, em que não existe nada fixo, nem espaço nem tempo absoluto, tudo está em relação a outras coisas. E o economista em crise reconhece que ficou parado no tempo. Por isso, sofre surpresas econômicas, cuja fácil sabedoria ex-post explica… Ele é apenas “um engenheiro de obra-feita”!

O economista, teórico da Ciência Econômica, percebe, então, que esta não pode ficar tão desatualizada em relação às outras ciências do Século XXI. Ele necessita integrar duas ideias fundamentais: primeira, os modos relacionais de pensar sobre o mundo; segunda, os modos evolucionários de refletir sobre o mundo com auto-organização. A evolução do pensamento sobre espaço, tempo e cosmologia, e a do pensamento sobre a evolução das espécies e a sociedade, ambas se deram em direção à união dessas duas grandes ideias advindas do evolucionismo e do relacionismo. A Economia da Complexidade busca integrá-las.

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