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Contrapondo as diferentes visões no debate da crise fluminense

Faço aqui uma tentativa de síntese de aspectos chaves para uma visão alternativa ao conjunto de visões usuais (entendidas como aquelas que disputam o senso comum) sobre a crise atual do Rio de Janeiro. Adoto uma abordagem esquemática baseada em um organograma (ver ao final do texto) que visa a servir de guia de referência para a análise. A partir disso, pontuo as divergências fundamentais na análise, algumas controvérsias sobre o tratamento de aspectos compartilhados e, por fim, uma agenda propositiva de linhas de pesquisas e de lutas políticas. Ao final você acessa o texto integral no qual explico com mais detalhe e passo a passo as partes do organograma.

Existem diferenças chaves de ponto de partida e de contextualização. Sobre o ponto de partida, a divergência fundamental é assumir como fenômeno essencial que a economia fluminense possui uma crise estrutural, no sentido de impasse em seu estilo de desenvolvimento. Portanto, não se teve “anos de ouro” no período anterior à crise para isso ser considerado como pressuposto e o foco da análise ser o questionamento de como isso teria sido desperdiçado.

Sobre a contextualização, a divergência fundamental é assumir um exercício de mediação entre escalas de análise e não um determinismo arbitrário de uma escala estadual ou escala nacional. Nesse aspecto, cabem duas observações. Primeira, no conjunto de visões usuais, seus determinantes somados não representam uma unidade interpretativa, mas apenas um punhado de recortes parciais segundo grupos de interesse que as reproduzem na opinião pública de forma isolada. Diferentemente, na visão alternativa, cada determinante é um elemento de uma unidade interpretativa.

Segunda observação, o conjunto de visões usuais tende a ser monoescalar. Assim, a maioria de seus determinantes não articula com o debate econômico na escala nacional, como se a crise fluminense não tivesse uma relação essencial com a crise econômica nacional. Já a visão alternativa assume que não há solução para o Estado do Rio de Janeiro que não venha junto de uma solução nacional e vice-versa, mas cabendo o exame das especificidades para englobar dialeticamente as duas dimensões.

Cabe assinalar que a maior parte das análises usuais considera que a causa principal da crise é por irresponsabilidade fiscal na gestão estadual. Apesar de possuírem desdobramentos próprios (a saber: políticas de austeridade e reformas legais, ou aprofundamento da Lava Jato na escala estadual e CPIs), elas convergem na busca de um “Estado eficiente”. Diante da proposta de uma interpretação crítica, esse objetivo é deixado sobre interrogação por ser uma aposta que pode se fundamentar apenas em idealização da neutralidade técnica.

De toda forma, isso encontra eco e apoio no mundo empresarial como a suposta base de um ambiente de negócios, então tomado como pressuposto para resultados econômicos positivos do ponto de vista das expectativas de mercado.

Diante disso, cabe alertar ao que em linguagem metafórica se chamada de “bodes na sala”. Dito de outra forma, trata-se de questões que podem ter sua relevância para o aperfeiçoamento legal e institucional, mas que são paralelas à discussão da crise de natureza essencialmente político-estratégica e, logo, desconsiderando isso não se associam a seus determinantes principais.

A ênfase nessas questões desvia o debate de tratar elementos mais decisivos para uma agenda propositiva de recuperação econômica, fazendo crer que se supera uma crise dessa gravidade apenas tangenciando sua dimensão econômica. Inversamente, cabe evidenciar o risco real existente: o fortalecimento da ideologia “antiestado” sobre a economia e seus efeitos deletérios sobre a organização da base produtiva.

Curiosamente, dentro do conjunto de visões usuais, o mesmo ponto de partida pode levar a uma vertente que não se prende aos “bodes na sala” identificados. Esta foca nos impactos econômicos negativos da Lava Jato somados ao fim das políticas de conteúdo nacional. Mas, nesse grupo de interesses surge uma controvérsia a destacar. Apesar de a interpretação crítica proposta não ter maiores divergências nos desdobramentos sob essa vertente, é importante destacar que tais questões não são a causa fundamental e nem resumem a explicação da crise fluminense como se fosse meramente provocada por determinantes externos. Logo, ao alterar o ponto de partida, alinha-se o discurso ao considerar que tais determinações explicitam um quadro de vulnerabilidades econômicas estaduais.

Cabe ainda destacar outra controvérsia, mas a respeito da política estadual de incentivos fiscais. Essa temática pode tanto estar inserida no conjunto de visões usuais como no viés crítico proposto, contrapondo-se os focos e respectivos desdobramentos. Portanto, nessa segunda controvérsia, fica claro que as orientações possuem diferenças de sentido, logo ainda não havendo sinalização de qualquer realinhamento convergente. Isso exigirá reconhecer que o valor incentivado está equivocadamente superestimado e essa questão não possui a centralidade que certos grupos de interesse acreditam, logo, carecendo de ser encaminhada de outra maneira.

Especificamente, caberia afastar o risco de redundar em uma “ideologia antiestado” sobre a economia e se voltar mais a discussão de eficácia, ou seja, avaliar como a política de fomento poderia responder aos desafios de recuperação econômica.

Após esclarecer divergências fundamentais na análise e algumas controvérsias sobre o tratamento de aspectos compartilhados, pode-se agora partir para uma agenda propositiva. A seguir, as diretrizes para a investigação de uma saída da crise são apresentadas e os encaminhamentos de uma agenda nacional e estadual de lutas políticas são integrados. Lembrando-se que esses aspectos se somam com as críticas às vertentes sobre irresponsabilidade fiscal (os “bodes na sala” identificados).

Do ponto de vista de uma agenda nacional, o cerne do problema envolve lutar contra a criminalização das políticas de desenvolvimento por coordenação do Estado, e repriorizar e aperfeiçoar a política de conteúdo local a fim de recuperar a visão estratégica na administração púbica nacional.

Do ponto de vista de uma agenda estadual, o cerne do problema envolve uma forte articulação política para tirar o Estado do Rio de Janeiro do isolamento político-estratégico como contraexemplo para a defesa de políticas de austeridade e reformas legais associadas na escala nacional, bem como fortalecer estruturas públicas de planejamento econômico indutor. Quanto a esse último ponto, o mais urgente é combater recomendações de ajustes que possam desestruturar mais uma máquina publica estadual já desestruturada.

Por fim, exibem-se em um único esquema-síntese todas as questões que foram antes separadas para facilitar o entendimento didático. Isso porque devem ser compreendidas e enfrentadas conjuntamente.

Leia aqui o artigo na íntegra: proposta de síntese crise RJ

Crédito da foto da página inicial: EBC

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