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Austeridade fiscal, restrição monetária e as lições de Keynes

John Maynard Keynes é conhecido por justificar a adoção de medidas do Estado para garantir o crescimento econômico dos países por meio do estímulo à atividade dos empresários – produtores e comerciantes – orientando as decisões destes para elevação do produto da economia e, assim, garantir o aumento do nível de renda e do emprego.

Não obstante, o economista inglês foi um estudioso dos processos inflacionários e deflacionários que acometeram a Europa nas primeiras décadas do século passado. Neste sentido, além de diagnosticar as causas que levam a economia à retração e depressão, apurou os fatores que perturbam o nível de preços.

Na sua experiência ao longo da Segunda Guerra Mundial, orientou a expansão do produto (civil e militar) com o exercício de controle dos preços e salários. Neste sentido, sua experiência não só é válida, como é obrigatória para a resolução dos nossos desafios: utilizar o Estado como estabilizador e não como fonte adicional de problemas.

No quadro atual de expectativas de inflação de 7,5% a.a.(na opinião desinteressada do mercado financeiro), de desvalorização do câmbio e em vias da retração do PIB (0,5%), é importante olhar para a política Fiscal e Monetária. Vamos nos deter nestas políticas centrais de condução do sistema econômico, tendo em vista que é a partir destas que políticas específicas e setoriais são pensadas.

Estamos diante de uma política de Austeridade Fiscal que já tem impactado vários setores da economia, em especial nas parcelas da população que tiveram seus benefícios sociais reduzidos ou postergados, nos alunos e pesquisadores que tiveram corte de bolsas de estudo e postergação dos financiamentos, nas esferas da administração pública federal, estadual e municipal que tiveram queda de orçamento, bem como todos os empresários que atendem às demandas destes setores e já têm perda de faturamento (a não ser que consigam elevar seus preços).

Do lado, a política de Restrição Monetária, conduzida pelo Banco Central do Brasil, está sendo intensificada por meio da elevação contínua da taxa de juros básica da economia (12,75% a.a.). O “mercado financeiro” tem apoiado as medidas, difícil esperar que o “mercado produtivo” faça o mesmo.

Do lado fiscal, o governo está garantindo não só que ele reduzirá a sua aquisição do produto da economia, mas que parte da população e dos empresários também irá reduzir as suas demandas. Do lado monetário, o Banco Central está garantindo que o Brasil terá o dinheiro mais caro do mundo.

Em economia, o que desestimula os gastos do consumidor acaba por desestimular o ímpeto dos empresários na condução rotineira dos seus negócios, bem como na ampliação destes. É uma questão de sobrevivência, você não produz o que não espera vender. Assim, é irreal recomendar corte de gastos e encarecimento do dinheiro em cenário de expectativas de inflação e retração econômica.

Keynes sempre disse que o tempo para equilibrar o orçamento fiscal é na fase de boom da economia, quando a atividade econômica está fortalecida e os empresários estão encorajados a assumir riscos (entre eles, o investimento).

Nestes períodos, o gasto do Estado é menos necessário, pois o gasto privado (consumo e investimento) consegue manter a economia em expansão. O Estado pode elevar impostos neste período, pois o faturamento do empresário e as rendas do público estão em expansão, ou seja, os impostos não são suficientes para impedir o ímpeto da atividade econômica quando as expectativas de ganho futuro são positivas e há confiança na sua realização.

Adicionalmente, o Banco Central não deveria se comprometer com a estabilidade do nível de preços, uma vez que ele não controla a definição dos preços e das rendas da economia.

Salvo engano, a oferta e a demanda dos agentes no “Mercado” é que as definem. Neste sentido, quando o Banco define uma meta sobre o que não controla, ele está arriscando a sua reputação, ficando sujeito à perda de credibilidade e ao uso de doses cada vez mais amargas de um remédio que não funciona para conter inflação, mas que é fatal para conter o produto, em especial, o investimento.

O Banco Central é responsável pela gestão da moeda da economia. Ele tem certo controle sobre a criação de crédito e sobre o custo do dinheiro. Quando o Banco utiliza políticas de encarecimento do dinheiro, ele está sendo eficiente em derrubar a demanda do consumidor e dos empresários.

Além disso, ele está sendo eficiente em reduzir a produção de bens de consumo e em anular o ímpeto da produção de bens de investimento. Assim, o uso dos juros para combate à inflação é efetivo contra o lucro, o investimento e a confiança dos empresários. O equívoco é que o Banco Central faz algo que cientificamente não lhe cabe, pois ele é o gestor da moeda e dos juros, não dos preços e das rendas.

É difícil de acreditar que a articulação Fiscal-Monetária em curso seja a favor do crescimento econômico e contra a inflação, quando tem resultado em queda da demanda doméstica, do produto e na elevaçãodos preços.

O Brasil está deixando de ser senhor do seu destino ao apostar a vida dos brasileiros na mítica elevação da produtividade e no comércio exterior, em detrimento do investimento e consumo domésticos.

A despeito das opiniões recentes de Delfim Netto e do Ministro Levy (leia AQUI, AQUI e AQUI), a tática mercantilista de construir saldos externos é uma ilusão em um mundo estagnado. A desvalorização cambial é geral, pois todos querem elevar exportações. O ganho de produtividade defendido teria que ser incrível, algo como uma Revolução Tecnológica, e a curtíssimo prazo.

A demanda que falta ao nosso PIB dificilmente virá do exterior, sobretudo quando reduzimos a já insuficiente demanda interna. O desafio apenas se agrava quando o empresário não tem condições de atuar como tal e o Estado não segue os exemplos da história e a solução de Keynes.

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