Em toda esquina tem fast food, lojas de conveniência e atacados repletos de ultraprocessados. Mas praças, parques e terminais de ônibus poderiam ter quiosques de frutas, sucos e in natura em geral
Duas reportagens recentes, uma da Revista Radis, da Fiocruz, outra do Jornal Nacional, da TV Globo, retratam um problema que precisa ser combatido com urgência: o da má alimentação da população brasileira.
O Jornal Nacional citou, a partir de estudos do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens), da Universidade de São Paulo (USP), que essa má alimentação custa por ano ao Sistema Único de Saúde (SUS) quase R$ 9 bilhões. Isso porque a alimentação inadequada causa diabetes, hipertensão e outros males.
Já a matéria da Radis denuncia o racismo alimentar: “a população pobre, negra e periférica é a mais atingida pela dificuldade de acessos aos alimentos”. Enquanto em bairros nobres vemos feiras, mercados e restaurantes especializados em orgânicos, nas regiões periféricas a prevalência é de produtos ultraprocessados.
Quais as saídas?
Avançamos bastante. Provocada principalmente pelos próprios resultados que nos últimos 20 anos o Nupens/USP vem apresentando, a sociedade conseguiu fazer valer direitos como informações adequadas em rótulos, garantir melhor merenda nas escolas e colocar a segurança alimentar em pauta. Aliás, o Guia Alimentar para a População Brasileira, que completa dez anos 2024, é fruto desse movimento.
·Baixe aqui o Guia Alimentar para a População Brasileira: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_alimentar_populacao_brasileira_2ed.pdf
Estamos encerrando um período de eleições municipais e o tema, porém, foi nada, ou quase nada, abordado nas campanhas e debates. Quando o tópico “saúde” está em discussão, fala-se em zerar filas para exames, ampliar rede de unidades básicas e UPAs, o que é fundamental, só que pouco se trata das ações de prevenção.
E oferecer condições para alimentação saudável em nossas cidades está na base dessa atenção primária. Encontramos nas esquinas redes internacionais de fast food e de mercadinhos ou lojas de conveniência, atacados e outros estabelecimentos em que o predomínio é de ultraprocessados. Barracas de frutas, quiosques de sucos e alimentos in natura são raros.
A reforma tributária, em tramitação no Congresso Nacional, prevê o Imposto Seletivo – uma sobretaxação de produtos nocivos à saúde. Há mobilização para que bebidas industrializadas açucaradas, entre outros itens ultraprocessados, estejam na lista, mas, diante do poder econômico dos fabricantes (mega corporações transnacionais), é uma tarefa difícil. Em contrapartida, itens da cesta básica serão isentos, o que é um estímulo significativo.
Há medidas, contudo, possíveis de serem tomadas pelo poder público municipal. Por exemplo, políticas (fiscais, inclusive) de estímulo a pequenos estabelecimentos que dispensem o comércio de ultraprocessados. Implementar em praças, parques e terminais de ônibus bancas, barracas, quiosques de alimentos in natura ampliaria o acesso. Implementar e incentivar hortas urbanas de orgânicos expandiriam a produção.
Aliás, a reportagem da Radis traz outras iniciativas nesse sentido, adotadas no município do Rio de Janeiro como política pública, e que vemos em outras cidades, ainda como ações de movimentos sociais. O Prato Feito Carioca, feito por cozinhas comunitárias (são 37 na cidade), e o Hortas Cariocas são dois dos programas citados.
Não é difícil. É ter vontade política.
Wagner de Alcântara Aragão é jornalista e professor. Mestre em estudos de linguagens. Licenciado em geografia. Bacharel em comunicação. Mantém e edita a Rede Macuco.
Crédito da foto da página inicial: Divulgação/Prefeitura do Rio de Janeiro. Equipe de uma das Cozinhas Comunitárias Cariocas, que distribui o Prato Feito Carioca nos bairros da cidade.
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