Antes apresentar qualquer análise sobre os últimos fatos do novo governo, é preciso partir de um questionamento absolutamente pertinente a respeito das últimas decisões da área econômica.
Porque, sobre a nomeação do novo ministro, só há duas análises possíveis: 1) ou o governo negocia mal e o mercado negocia bem; 2) ou o mercado tem mais poder que o governo para impor uma agenda econômica. Provavelmente, essas não são análises excludentes.
O governo supostamente é formado por habilidosos articuladores e deveria ter entre seus negociadores gente capaz de usar as estruturas de Estado em favor de políticas de governo.
Mas, os fatos mostram o contrário. Basta observar que depois de 12 anos da carta ao povo brasileiro, mais uma vez um governo petista se vê em situação de discutir com o mercado e com seu próprio partido um nome que agrade ao mercado para a Fazenda.
Em política, a negociação é fundamental. Para implementar políticas, gerar resultados, disputar o poder em sociedades heterogêneas é preciso compor e recompor forças por meio da negociação. Mas a agenda vem antes.
A noção dos limites do que se negocia é mais importante do que o que se negocia para a esfera da política. Ou seja, posso negociar qualquer coisa, desde que dentro dos meus interesses.
Quando a negociação perde o foco ou distancia o grupo político da sua agenda, há risco de perder-se em decisões equivocadas. Assim, quem tem mais poder define a agenda da negociação. Assim, o exercício do poder em uma democracia necessita, fundamentalmente, de agenda e de negociação para implementá-la.
Para os agentes econômicos, a negociação não está submetida à agenda, mas ao resultado. O acúmulo em termos de balanço do fluxo e do estoque é o alvo dos negócios econômicos. A negociação se submete ao ganho e à possibilidade objetiva de rentabilidade. O jogo da troca não é o fim, mas o meio para acumular e atingir direta ou indiretamente o lucro.
Mas, por que em 12 anos pouco se avançou em termos de política econômica? Por que o governo negocia mal? Ou será que o mercado tem mais poder para definir a agenda política do próprio governo? Talvez a resposta não esteja na afirmação das duas respostas, mas em partes de verdades para ambos os casos.
O governo negocia mal
O governo pode negociar resultados, mas não pode negociar sua agenda. Na medida em que fornece aos adversários deliberação sobre sua agenda, perde poder e perde também autonomia.
Obviamente, há o entendimento dentro dos governos do PT de que não há força política para implementar todas as agendas desejadas, por isso é importante escolher algumas.
Mas, quando esse entendimento deixa de forçar avanços (ainda que pequenos ou negociados), corre-se o risco de estagnação do processo político, que significa abandonar sua agenda em função das crises geradas pelo curto prazo.
O mercado tem poder para impor a agenda
Em partes é verdade: o mercado tem capacidade para sangrar economicamente o governo e impor fortes perdas ao setor público. Mas, também é verdade que se entrar em cabo de guerra com a economia pode sair muito machucado ou dispor de fortes perdas.
Pra isso o mercado compra propaganda. Sozinho, não é capaz de enfrentar o governo, mas, apoiado por setores da mídia, pode fazer o governo recuar em suas pretensões para evitar desgastes. Enfim, no curto prazo o governo pode ser colocado refém do mercado. Mas, isso não é verdade para o longo prazo.
Com o atual poder que dispõe, o mercado coloca sua agenda de curto prazo e deixa o governo com pouca capacidade de negociação. Pode ser necessário abrir mão do curto prazo, mas isso não pode significar para o governo perder o controle da agenda de médio e de longo prazo.
Se a taxa de juros de 2015 chegar a 13% alimentando a barriga d’água dos rentistas, o que deve vir em troca para 2016? A reforma tributária? A taxação sobre grandes fortunas? A redução da renúncia fiscal?
Em resumo, é contraproducente ao PT ou aos setores progressistas dos movimentos sociais e de esquerda discutir com o governo o nome do ministro da Fazenda – interessa negociar a agenda.
Se o ministro é de origem nas finanças, no setor produtivo ou na academia, isso não vem com um atestado de competência ou isenção. O novo ministro deve entrar assumindo compromissos concretos.
Neste quesito, o governo do PT deve tomar as rédeas da situação para não errar. Porque nomear um ministro com compromisso de curto prazo e agenda é repetir o erro de 2002. É tudo que um novo ministro pró-mercado quer: apresentar resultados para a economia.
Mesmo que essa não seja a agenda do governo, ao admitir que, sem resultados econômicos, é mais difícil governar, o Planalto cai na armadilha do mercado e torna a agenda de governo a agenda do mercado.
O mercado negocia bem e o governo e seus setores progressistas negociam mal.
Enfim, não é o nome do ministro que deve ser tratado como uma agenda política, nem o calor do momento deve pautar a escolha, porque o governo se torna refém da agenda de curto prazo. E, no curto prazo, concordamos todos, as contas precisam de ajuste.
A pergunta não é só para onde vai o ajuste nas contas do governo, mas, principalmente, qual a política da Fazenda para o médio e longo prazo. Qual o compromisso do novo ministro com a reforma tributária?
Que resultados para isso ele se compromete a apresentar em quatro anos? Qual a agenda do novo ministro para a evasão de divisas? Que planos ele tem para contê-la? E para a renúncia fiscal? Qual a agenda? Para a desconcentração e democratização das finanças? Qual o plano nos próximos quatro anos?
Sinceramente, o nome do ministro da Fazenda é o menos importante, na medida em que o que se espera dele e que respostas ele deve apresentar esteja claro.
Se a agenda não for construída pelo Planalto, certamente, aí importa a origem, porque ao nomear um ministro para cortar gastos e ajustar a economia pode ser um cheque em branco para os rentistas terem de novo seu espaço estruturado para lucrar e encurralar o governo.
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