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A produção de conhecimento doméstico como fator de desenvolvimento das nações

A preocupação com o desenvolvimento das nações é um dos principais motivos do estudo da economia. Desde Adam Smith, em seu famoso “A Riqueza das Nações”, publicado em 1776, os economistas estão preocupados com os fatores do desenvolvimento e também com as causas do atraso econômico, como foi o caso de Celso Furtado em “O Mito do Desenvolvimento Econômico” e de demais economistas estruturalistas.

Um elemento que passou a ter destaque nas análises econômicas, pelo menos naquelas influenciadas por Joseph Schumpeter e seus seguidores, está na ênfase da importância do processo inovativo no desenvolvimento econômico e as maneiras com que é possível fomentá-lo.

Seguindo a corrente schumpeteriana, o desenvolvimento econômico se dá por mudanças da vida econômica que ocorrem endogenamente e repousam sobre o desenvolvimento precedente, deixando evidente a importância do caráter cumulativo nesse processo.

Para se desenvolver é preciso inovar constantemente. “É preciso combinar materiais e forças que estão ao nosso alcance (…)”, como diria Schumpeter (1). É preciso ter acesso a uma ampla gama de conhecimentos que se encontram documentados e enraizados em rotinas, processos e indivíduos para que novas combinações sejam tentadas e, se bem- sucedidas, abre-se espaço para inovações.

Ao ampliar o estoque de conhecimento, ampliam-se as oportunidades tecnológicas. O que é possível a partir de esforços para avançar a compreensão científica e tecnológica. Certamente, as competências nacionais – refletidas pelas competências das organizações e dos indivíduos – são elementos primordiais a serem considerados se uma nação busca expandir suas oportunidades, inovar e se desenvolver.

Entretanto, quando os avanços científicos e tecnológicos – originários de outras indústrias e outras organizações – estão de alguma forma protegidos (mediante segredos e/ou leis), há uma redução das oportunidades tecnológicas.

Daí as críticas severas da economista Edith Penrose (2) em relação às propriedades intelectuais, sobretudo as patentes, para nações em desenvolvimento. De acordo com Penrose, essas nações não se beneficiam de maiores proteções do conhecimento (por intermédio de propriedade intelectual), uma vez que a posse dos conhecimentos protegidos concentram-se nas mãos de não-residentes. Em muitos países, como é o caso do Brasil, a maioria das patentes concedidas pertencem a não-residentes.

Não coincidentemente, esforços em ampliar o estoque de conhecimento estão diretamente relacionados a elevados níveis de renda per capita. As nações que foram capazes de se desenvolver com sucesso foram as que promoveram o aumento no estoque de conhecimento e fomentaram a ampliação das competências das organizações e dos indivíduos.

Na Figura 1 abaixo, é possível verificar diferentes grupos: um formado por Finlândia, Holanda, Dinamarca, Alemanha, Reino Unido, França, Japão, dentre outros, que possuem renda per capita muito superior à média mundial (US$ 25.208,35, em 2010) e mais de 50% dos pedidos de patentes por residentes; um grupo formado pelos latino-americanos e outros como a Índia, Egito, África do Sul, Argélia, Malásia, Filipinas, Indonésia, etc., com renda per capita muito inferior a média mundial e menos de 50% dos pedidos de patentes nas mãos de residentes.

Outro grupo formado por nações com renda per capita abaixo da média mundial, mas que possuem mais de 50% dos pedidos de patentes nas mãos de residentes (Romênia, Hungria, Bulgária, Turquia e Polônia) e finalmente, outro grupo, formado por Nova Zelândia, Canadá e Israel, que possuem renda per capita superior à média mundial e baixo nível de pedidos de patentes nas mãos de residentes. Há ainda nações que possuem comportamentos que merecem esforços de investigação para melhor entendê-las, como é o caso dos EUA, Coreia do Sul e China.

Figura 1- Pedidos de patentes nas mãos de residentes por renda per capita, 2010.


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Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do Banco Mundial e OMPI

Os pedidos de patentes não garantem que a mesma será concedida e, uma vez concedida, nada assegura que ela será utilizada. Portanto, não é garantia de que haverá processo inovativo. Ademais, uma patente depositada e posteriormente concedida leva tempo e, por isso, os dados da Figura 1 não devem ser vistos como uma relação causal entre elevado volume de patentes nas mãos de residentes em 2010 e elevado nível de renda no mesmo ano. A elevada renda resulta de processos de produção e apropriação do conhecimento doméstico acumulados no tempo.

Certo é que a evolução recente associada à economia do conhecimento tem direcionado ainda maior atenção à necessidade da apropriação do conhecimento nas mãos de residentes.

A figura abaixo ilustra claramente a incursão dessa estratégia como um posicionamento importante a ser perseguido pelas nações. Os dados são a média de cinco anos para períodos a partir de 1980, para grupos de países com classificação de renda da ONU (nações com alta renda, renda média superior e renda média inferior). É notável o aumento de importância do patenteamento nas mãos de residentes para nações com renda superior, infelizmente um caminho que não foi seguido por nações relativamente menos desenvolvidas, que possuem renda média inferior.

Figura 2 – Percentual de patentes nas mãos de residentes por grupo de nações de acordo com a renda, por período.


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Fonte: Elaboração própria a partir de dados da OMPI e da ONU

Assim, tanto acontecimentos históricos quanto testes estatísticos apontam para a importância de se considerar a apropriação tecnológica doméstica como uma estratégia a ser seguida para o desenvolvimento econômico.

Em nossas pesquisas recentes, mostramos que a estratégia de apropriação interna de conhecimento tem se mostrado tão importante quanto as estratégias ligadas à educação e maturidade do sistema de inovação para os países que possuem renda elevada, para qualquer período analisado desde 1991.

Um aumento do estoque de conhecimento nas mãos de residentes é um fator importante para gerar renda de longo prazo em um sistema econômico, uma vez que os residentes são capazes de se apropriar dos ganhos para o uso deste novo conhecimento. Em tempos de cadeias globais de valor e mobilidade do capital, manter o conhecimento domesticamente protegido tem se mostrado uma estratégia de extrema relevância.

Notas

1) SCHUMPETER, J.. A teoria do desenvolvimento econômico. São Paulo: Nova Cultura, 1985.

(2) PENROSE, E.. International Patenting and the Less-Developed Countries. The Economic Journal, v. 83, n. 331, p. 768-786, 1973.

Os pensamentos e ideias expressos neste trabalho não refletem necessariamente aqueles do INT/MCTI. Os eventuais erros são de inteira responsabilidade dos autores.

Crédito da foto: Agência Fapesp

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