Para os candidatos da oposição e alguns analistas do mercado financeiro, o baixo crescimento do investimento e do PIB nos últimos anos podem ser atribuídos a uma crise de expectativas do setor privado, que estaria vivendo uma era de fortes incertezas quanto à política econômica do governo e suas repercussões sobre a economia.
Exemplificando, em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, em 26/01/14, Aécio Neves argumentou que o governo “perdeu a capacidade de gerar expectativas positivas” no mercado. Poucos dias antes de sua trágica morte, em declaração ao Estado de S. Paulo, em 05/08/14, o candidato Eduardo Campos havia afirmado que “a economia não é ciência exata, tem a ver com expectativas [que] só têm piorado pela má governança e falta de confiança dos agentes econômicos no futuro do país”.
A fala de Campos é representativa de uma parcela importante da oposição, assim como a de Aécio. A partir de tal diagnóstico, seus partidos e aliados vêm defendendo que uma melhor gestão das contas públicas, quando combinada a uma política monetária orientada exclusivamente para o controle da inflação, seria suficiente para restaurar a confiança dos investidores e o crescimento econômico.
Em bom português, uma política de contração fiscal seria expansionista em última instância, já que ativaria as tais expectativas do setor privado, permitindo, assim, uma volta ao tão desejado cenário de baixa inflação e alto crescimento.
O discurso da “contração fiscal expansionista” pela restauração da confiança dos investidores não é original do Brasil e dos presidenciáveis. Este raciocínio foi promovido, por exemplo, pelo ministro da Fazenda alemão Wolfgang Schäuble, quando da defesa da austeridade como solução para a crise europeia.
Ao contrário do que previu ele, no entanto, as políticas de contração de gastos públicos nesses países apenas acentuaram o problema de falta de demanda, minando qualquer perspectiva de retomada do investimento privado.
O fraco nível de atividade econômica, por sua vez, explica a baixa arrecadação tributária verificada nos períodos seguintes, o que tornou ainda mais difícil o controle das contas públicas e completou o ciclo vicioso que ainda paira sobre a maior parte dos países europeus.
A lição que deve ser tirada de tais evidências é de que no Brasil, assim como no resto do mundo, o investimento privado parece sim responder a expectativas – a expectativas de demanda. Como indicam as frequentes declarações dos empresários da indústria nacional, não há razão para investir e aumentar a capacidade produtiva quando as plantas industriais já existentes estão subutilizadas e os estoques se acumulam.
De fato, os dados brasileiros mostram que mesmo com a alta penetração das importações que caracterizou a última década, que era fruto sobretudo do câmbio sobrevalorizado, o investimento cresceu sempre que o mercado interno se expandiu.
No acumulado entre 2005 e 2013, o investimento cresceu 89% em termos reais, período este em que consumo cresceu 61%. Por outro lado, os anos em que o investimento parou ou retrocedeu foram os mesmos em que o consumo desacelerou, já que este último e a consequente piora no desempenho do varejo sinalizam para os empresários um enfraquecimento da demanda.
Nesse contexto, a inflação mais alta prejudica sim a retomada do investimento, mas não pela existência do que Paul Krugman apelidou da “fadinha da confiança”, ou confidence fairy em inglês, e sim por contribuir para uma piora do poder de compra dos trabalhadores e, assim, para uma desaceleração do consumo e da expansão do mercado interno.
Uma política de contração fiscal e repressão dos salários, por outro lado, poderia nos levar, na melhor das hipóteses, para um cenário de baixa inflação e baixo crescimento. Isto porque o benefício para a demanda de se controlar a inflação seria eliminado, nesse caso, pelo baixo crescimento dos salários nominais e a redução dos investimentos e demais gastos públicos.
Na pior das hipóteses, no entanto, esta opção nos levaria de volta para o baixo crescimento e a inflação ainda mais alta que caracterizaram a segunda metade da década de 1990.
A via para a volta ao equilíbrio da baixa inflação e do alto crescimento felizmente não requer toques de mágica. Passada a pressão – de caráter temporário – que as desvalorizações cambiais desde 2012 exerceram sobre os custos dos importados e que vem sendo repassada aos preços em geral, a retomada do investimento privado passa a depender da volta do dinamismo da demanda nos mercados interno e externo.
No âmbito externo, ao mesmo tempo em que a crise argentina tende a prejudicar no curto prazo as exportações de alguns de nossos produtos industriais, em especial da indústria automobilística, a economia norte-americana apresenta sinais cada vez mais fortes de recuperação.
No âmbito interno, além da inflação mais baixa já mencionada, a volta do dinamismo da demanda exige basicamente: (1) a manutenção das políticas de transferência de renda e da regra que garante o crescimento real do salário mínimo, ambas essenciais para o crescimento do consumo, e (2) a ampliação dos programas de investimento público e de concessões na área de infraestrutura.
Tais melhorias na infraestrutura, além de garantir injeções diretas de demanda, também contribuem para reduzir os custos de produção e restaurar a produtividade da indústria, contornando assim o conflito entre elevar salários e ganhar competitividade.
Por fim, tanto o dinamismo do mercado interno, quanto a recuperação do mercado externo, poderão ser melhor aproveitados pela indústria nacional ao nível atual de taxa de câmbio real, que já está em patamar mais competitivo do que o que vigorou durante a segunda metade da década de 2000.
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