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A crise internacional continua

A crise financeira internacional começou nos EUA em 2007 com o estouro dos subprimes que, nesse primeiro momento, não afetou as economias da América Latina.

Estas continuaram crescendo no embalo da imensa liquidez internacional, dos bons preços internacionais de commodities e do impulso da grande transformação da economia chinesa – como bem resumiu Ricardo Bielschowsky, tudo o que a China compra sobe de preço e tudo que vende baixa de preço. Assim, exportou por mais de uma década deflação nos preços de manufaturas e inflação de commodities.

Essa mudança estrutural fundamental no mercado mundial esteve na base da grande moderação pós-1994. Até o polêmico Kenneth Rogoff reconhece que, além do crescimento da produtividade e das políticas monetárias inovadoras, a deflação gerada pelo fenômeno de uma China crescendo a mais de 11% ao ano e com seu comércio exterior num ritmo três vezes mais rápido foi decisivo na queda da inflação global dos níveis de 30,4% (1990-1994) ao ano para 4,1% ao ano (2000-2003).

Qualquer que tenha sido a política monetária adotada por cada país nesse período, centenas alcançaram a desinflação. Quase todas com âncoras cambiais e salariais que, posteriormente, em muitos casos, foram substituídas por regimes de metas de inflação e câmbios com flutuação administrada (livre flutuação é fantasia de livros textos).

Esse mundo se tornou mais complexo com a inundação de liquidez que o FED liberou pós 2001. Com a crise das ponto.com, o colapso de Enron e o ataque às torres gêmeas (leia-se Wall Street) e ao Pentágono, a preferência pela liquidez subiu drasticamente e o FED tentou evitar o colapso reduzindo as taxas de juros e ampliando a oferta monetária.

Isso ampliou tanto o fluxo financeiro aos países emergentes e latino-americanos como seus superávits comerciais. Ao efeito da demanda chinesa, no pós 2001, somava-se a especulação nas bolsas de mercadorias, com novos atores protagônicos, além dos tradicionais hedgers, os fundos de pensão e de investimentos.

Nasce aí a chamada bonança dos preços das commodities. A crença de que não se deveria controlar essa inundação de dólares nas economias periféricas levou a uma superapreciação de suas moedas nacionais.

China deflacionando as manufaturas e a dinâmica comercial e financeira apreciando as moedas locais destruíram os incentivos aos investimentos na indústria desses países e sua própria rentabilidade.

Surge um avassalador processo de lock-in, a reprodução ampliada de economias primário-exportadoras. As indústrias passaram a ter uma balança comercial crescentemente deficitária.

O FED, depois do colapso de 2007 e da quebra do Lehman Brothers em 2008, dobrou a aposta e zerou as taxas de juros e passou a socorrer grandes empresas e a nacionalizar bancos em perigo.

Com seu PIB se arrastando e o desemprego estourando, adotaram o chamado quantitative easing, já que a taxa de juros já não era mais instrumento manejável nesse contexto de armadilha da liquidez.

Paralelamente, outro drama se desenvolve na Europa. As economias periféricas desse continente ficaram superendividadas pela disponibilidade de dinheiro fácil e falta de risco cambial, pois que aderiram ao Euro. Muita especulação imobiliária, pouca geração de produtividade e aumento das importações resultaram em crise de dívida e cambial.

Outra crença fez com que o BCE não abandonasse sua ortodoxia e funcionasse como credor de última instância. A Grécia, Portugal, Espanha, Itália e outros foram caindo como dominós.

O resultado foi que, sem ter a economia americana recuperada, o mundo vê a economia europeia cair em uma longa recessão. Mesmo a economia mais sólida da Europa, Alemanha, agora vem amargando um crescimento baixo. Com esse quadro, nem China conseguiu manter suas taxas de crescimento do PIB em 11% ao ano entre 2003 e 2010, e ajustou para 7,5%.

Com EUA crescendo pouco, Europa em estagnação, Japão sem tendência sólida de recuperação com o Abenomics, e China desacelerando, América Latina sofreu o impacto.

Depois de recuperar-se bem em 2010 da crise de 2009, a taxa média de crescimento da região vem diminuindo ano após ano, de 5,8% em 2010 ao estimado 1,8% em 2014.

O crescimento do comércio que havia voltado à média anterior de 15% a 20% a.a., não chega hoje a 2% e caindo. As grandes economias latino-americanas, Brasil, México e Argentina, revelam baixo dinamismo e as médias economias, principalmente as mineiras, Chile, Peru, já desaceleram e Colômbia deve seguir esse padrão, apesar de apresentar mais resiliência.

Uma coisa está clara: as instituições multilaterais, como FMI, Banco Mundial, Cepal, entre outras, nunca fizeram tantas revisões de suas estimativas e para baixo.

O que há de positivo em nossa região é que as taxas de desemprego continuam caindo, os indicadores sociais melhorando, como pobreza, distribuição de renda, mas agora em ritmo mais lento.

A crise internacional continua e a incerteza é crescente. Os ativos podres gerados pelas crises dos EUA, Europa, Japão estão nas gavetas à espera de contabilização. Isso ainda não se fez, e não se fará tão cedo, pois o sistema financeiro não resistiria a tal procedimento. Enquanto isso, os especuladores se refestelam com a volatilidade. Para eles, esse quadro é de boa pescaria.

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